Macroevolução e microevolução

O tema da evolução das espécies é objeto de controvérsia entre cientistas e entre estes e religiosos. Como escrevi no artigo “Revolução e evolução” (https://holonomia.com/2017/08/03/revolucao-e-evolucao/):

Ressalte-se que o próprio Darwin não considerava sua teoria incompatível com a criação, pois ele aceitava a ideia de leis naturais, as quais tornam possível a evolução. Para Vittorio Hölse, que afirma ser necessária uma interpretação teleológica da natureza, podemos ver finalismo no mundo como um todo, o que também ocorre na evolução darwiniana. Hösle transcreve as seguintes palavras de Darwin: ‘When thus reflecting I feel compelled to look to a First Cause having an intelligent mind in some degree analogous to that of man; and I deserve to be called a Theist’ (In, Vittorio Hösle. God as reason: essays in philosophical theology. Notre Dame, Idiana: University of Notre Dame, 2013, p. 29). Em tradução livre: ‘Quando assim refletindo, eu me sinto compelido a procurar por uma Primeira Causa tendo uma mente inteligente, em certo grau análoga à do homem; e eu mereço ser chamado um Teísta’. Contudo, posteriormente, mesmo tendo dito que passou por uma experiência quase religiosa quando esteve nas florestas do Brasil, Darwin não mais se declarou teísta, mas agnóstico (Idem, p. 33). E Hösle ainda ressalta, como antes salientado, que a visão de mundo religiosa é a base da ciência moderna: ‘There is little doubt nowadays among historians of science that the miracle of modern science was profoudly rooted in a religious vision of the world’ (Ibidem), ou seja, ‘há poucas dúvidas hoje em dia entre os historiadores da ciência de que o milagre da ciência moderna estava profundamente enraizado em uma visão religiosa do mundo‘.

Sobre isso, referindo-se a palavras de Asa Gray, Hösle afirma que a disputa (atualmente entre os neodarwinistas ateus e os teístas) não era entre darwinismo e criacionismo, mas entre acaso e desenho. Aduz, Hösle, ainda, que a evolução é compatível com a mente consciente como o desenvolvimento de fins mais complexos: ‘bringing forth entities that have increasingly complex ends is, so to speak, an end either of nature or of its creator; and the highest end is the generation of a being that can ask the question of what an ultimate end is’ (Idem, p. 48), isto é, ‘produzir entidades que têm fins cada vez mais complexos é, desse modo, um fim da natureza ou de seu criador; e o mais alto fim é a geração de um ser que pode fazer a pergunta sobre o que é um fim supremo’”.

Portanto, volto ao assunto porque ele também é mencionado por Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi, no livro citado no artigo anterior, ao abordarem a disputa entre acaso e desenho, negando a existência de Desenho Inteligente, porque esta ideia carregaria “consigo ignorância e concepções errôneas sobre a ciência”, além de pregar “a ignorância e o medo”, sendo uma “nuvem de falsidade” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 264).

Capra e Luisi, seguindo a proposta de Humberto Maturana, sustentam a existência de um “determinismo estrutural”, pelo qual o comportamento dos organismos não é determinado por forças externas, mas por suas próprias estruturas, que são formadas a partir de sucessivas mudanças estruturais. Ao determinismo estrutural, junta-se a ideia de contingência, substituindo a noção de acaso, como uma força motriz da evolução: “contingência, definida no dicionário como ‘uma ocorrência imprevisível’, é a ocorrência simultânea de fatores que são independentes uns dos outros, mas que, juntos, determinam um evento específico em uma situação temporal espacial precisa” (Idem, p. 265).

Nesse ponto, os citados autores adotam procedimento semelhante ao de Stephen Hawking, como citei no artigo “Ciência: a luta do cosmos contra o caos” (https://holonomia.com/2016/08/13/ciencia-a-luta-do-cosmos-contra-o-caos/):

Stephen Hawking, o arauto do ateísmo materialista moderno, afirma que ‘na teoria quântica, a capacidade de fazer previsões exatas é apenas a metade do que era na visão de mundo clássico de Laplace. Todavia, dentro desse sentido restrito, ainda é possível afirmar em determinismo’ (In O universo numa casca de noz. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 108). Nesse ponto ele deturpa o conceito de determinismo, para tentar manter sua posição científica, como a ideia de uma mulher meio grávida”.

Isso porque o “determinismo estrutural” pode incluir uma estrutura ainda mais sutil, com um determinismo completo, que se mostra fenomenologicamente como contingência, ou seja, que possui aparência material de aleatoriedade, sem, de fato, haver acaso, porque o conceito de cosmos inclui o de ordenação completa. Depois que foi comprovado o entrelaçamento quântico é difícil sustentar a existência de fatores independentes no mundo físico. O fato de não conhecermos a estrutura última da natureza, inclusive no possível (provável) nível subquântico, não impede que exista essa realidade sutil, que determina estruturalmente tudo o que ocorre, o Cosmos que organiza a si próprio.

Essa controvérsia, abordada no artigo “Ciência: a luta do cosmos contra o caos”, se o mundo é regido por uma ordem absoluta ou pelo acaso, é uma divergência é radical, que separa duas visões de mundo, um que é governado por Deus, pelo Logos, e outro em que não há ordem, mas caos e coincidências aleatórias.

Como tenho sustentado em meus escritos, defendo uma visão de mundo Cristã, que pressupõe a existência de ordem, de uma Razão Universal, de um Logos, de um Cosmos, de um Deus, onisciente, onipresente e onipotente, perspectiva essa incompatível com o darwinismo, ou seja, com a “noção de que a natureza procede de maneira aleatória em seu desenvolvimento – ou seja, sem obedecer a qualquer plano predeterminado” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 234).

Portanto, ainda que Capra e Luisi substituam o termo “acaso” por contingência, como visto acima, apesar da sua compreensão de uma imprevisibilidade material da evolução, segundo penso, para que haja ciência autêntica, para que haja Cosmos, demanda-se a existência de uma previsibilidade ideológica, ou espiritual, de plena Unidade.

Além disso, o conceito de evolução inclui a ideia de uma mudança temporal, da evolução que ocorre no tempo, e a natureza do tempo é duvidosa desde as descobertas da física moderna, tando da relatividade quanto da orgânica quântica, pelas quais pode haver algo fora do espaço-tempo, Eterno…

Para a luz não há tempo, uma vez que em sua perspectiva tudo é instantâneo, também não havendo tempo nos fenômenos de entrelaçamento quântico. Portanto, o conceito científico de evolução das espécies é incompleto, porque a física moderna pressupõe uma Inteligência Cósmica não local e não temporal, um Logos, que não se limita ao espaço, não se limita ao tempo, que existe instantânea a atemporalmente, pelo que a própria ideia de evolução se mostra, nesse sentido, parcial, e relativa

Como cientista, outrossim, entendo que negar a hipótese evolutiva é negar os fatos, negar a razão, pois o conceito de evolução é evidente na observação da natureza, desde a evolução cósmica até o desenvolvimento de uma simples planta, não sendo razoável sustentar que Deus criou o mundo há seis mil anos. De outro lado, também pode ser considerada uma ofensa à racionalidade a narrativa segundo a qual o mundo é regido pelo acaso ou por contingências imprevisíveis, que contraria o princípio segundo o qual o mundo é organizado, porque pode-se ver organização e ordem no universo, e não confusão e caos. Sustentar acasos e coincidências é menosprezar a inteligência humana e a própria dignidade humana.

Se a evolução é fruto do acaso, isso tem profundas implicações filosóficas e para a vida prática humana e social, para o mundo jurídico, porque segundo esse pensamento não há diferença ontológica entre o homem e uma vaca, ou um chimpanzé. Se a vida humana é acidental, não é necessária, não é essencial ou qualitativamente mais valiosa do que a dos animais. Se o mundo é governado pela aleatoriedade, o comportamento daqueles que praticam massacres, matando dezenas de desconhecidos, não pode ser considerado irregular, ou ilícito, pensamento que é socialmente desastroso.

Esse ponto também serve para fundamentar a superioridade do Cristianismo em relação às demais religiões, ao conferir maior dignidade ao ser humano, compreendido como Filho de Deus, ao contrário de outras ideias religiosas que consideram sagrados animais irracionais.

Portanto, minhas principais críticas ao darwinismo, em que pese aceitar a tese de que há evolução (no tempo), consistem nas hipóteses pouco filosóficas de que a evolução é aleatória e de que ela é gradual. Sobre o segundo ponto, há dúvidas em relação à sua ocorrência, porque com a união do darwinismo com a genética populacional:

Aceitou-se que as características são herdadas como entidades discretas, chamadas de genes, e que a especiação se deve, muitas vezes, ao acúmulo gradual de pequenas mudanças genéticas – a macroevolução é simplesmente uma grande quantidade de microevoluções.

Desse modo, a síntese moderna é uma teoria sobre como a evolução funciona no nível dos genes, fenótipos (isto é, o aparecimento real do seres vivos e do seu comportamento) e populações. A principal controvérsia se referia – e, em parte, ainda se refere – à relação entre micro e macroevolução, controvérsia que surge, por exemplo, da objeção de que o registro fóssil, em qualquer sítio arqueológico, não mostra mudança gradual, mas, em vez disso, longos períodos de estabilidade seguidos de rápida especiação” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 236) (Grifo nosso).

Essas noções de microevolução e macroevolução podem levar à conclusão de que pequenas ideias, erradas ou certas, quando multiplicadas, levam a grandes erros ou grandes acertos, que ocorrem em saltos. Tal proposta justifica o mandamento Cristão de ser santo como Deus é Santo, para que sejam evitados até os pequenos erros.

Por isso, diversamente do que sustentava a tese evolutiva clássica, como provado pela física moderna, notadamente a orgânica quântica, a natureza dá saltos.

Dentro da visão Cristã podem ser constatadas noções de microevolução e macroevolução, ambas ligadas à pessoa de Jesus Cristo, que individualmente é a evolução individual humana, uma microevolução, ao mesmo tempo em que é e antecede a macroevolução social e física, a formação de uma nova forma de organismo, a humanidade como unidade orgânica e cósmica, que se completará como Reino de Deus, seguida de uma macroevolução ainda mais ampla, quando surgirão novos céus e nova terra.

Nesse sentido, o Cristianismo é uma teoria científica evolucionista e antecipou a ideia de evolução, mas com uma visão da evolução para o futuro, e não apenas para o passado, em que Jesus Cristo é o início do homem novo, a nova humanidade, a Vida que nasceu da vida, que já existe, mas ainda não se manifestou plenamente. A macroevolução já começou pela microevolução iniciada por Jesus CristoA proposta evolutiva é clara em são Paulo:

Primeiro foi feito não o que é espiritual, mas o que é psíquico; o que é espiritual vem depois. O primeiro homem, tirado da terra, é terrestre. O segundo homem vem do céu” (1Cor 15, 46-47).

A macroevolução provavelmente se desenvolve em saltos, após períodos de crise, como nas várias extinções em massa já ocorridas no planeta, que permitiram novas formas de vida.

Assim, a ideia de grande tribulação, como crise que antecede a chegada do Reino de Deus, pode ser vista como evento catalisador da desordem antes que a nova ordem se forme, é bastante científica e coerente com nossos conhecimentos racionais, quando após um acúmulo de energia ocorre um salto evolutivo, um salto quântico biológico, um salto qualitativo, como aqueles ocorridos nos níveis mais básicos da realidade.

Apesar da entropia, do aparente aumento da desordem, seguindo a segunda lei da termodinâmica, a evolução implica aumento da complexidade, com uma ordem cada mais sutil, em comparação com a ordem anterior.

E é importante ressaltar que o salto quântico, pelo que se conhece até o momento, não possui fase de transição, pois o momento de maior energia é desconhecido até o instante em que a passagem já ocorreu, sem duração de tempo.

Nessa linha de raciocínio, a macromudança, em termos humanitários, se decorrer da dominância da ideia de separação das pessoas implica em desordem global, o que é uma macroinvolução, pelo reino do anticristo que vivenciamos, colocando em risco a civilização e a vida no planeta; de outro lado, a dominância da unidade do Espírito leva ao Reino de Deus, a efetiva macroevolução humana, já antecipada em Jesus Cristo, que é inafastável, dentro da cosmovisão Cristã.

Ele é a Imagem do Deus invisível, o Primogênito de toda criatura, porque nele foram criadas todas as coisas, nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis: Tronos, Soberanias, Principados, Autoridades, tudo foi criado por ele e para ele. Ele é antes de tudo e tudo nele subsiste” (Cl 1, 15-17).

A unidade cósmica, o Logos, manifestou-se inicialmente em Jesus Cristo, modelo de comportamento que se expandiu pelo globo, ainda que a Ideia tenha sido divulgada com falhas estruturais, por ter sido semeado joio junto com o trigo, fato antecipado pela teoria, que corrobora sua cientificidade, até que as incoerências sistêmicas sejam corrigidas, quando haverá um salto em direção à macroevolução, durante a era messiânica, em que a energia humana se aliará às forças cósmicas, pela obediência à Lei, com progresso humano nunca antes experimentado.

Ao final desse período, finalmente, a macroevolução ocorrerá, para uma Vida ainda mais sutil, que incluirá as vidas já vividas, pela ressurreição dos mortos, em um novo ambiente cósmico, “um novo céu e uma nova terra” (Ap 21, 1); sim, a trombeta tocará, e os mortos ressurgirão incorruptíveis, e nós seremos transformados” (1Cor 15, 52).

Ainda que a imprevisibilidade material impeça o conhecimento das propriedades emergentes do novo ciclo evolutivo, o Espírito Santo já as revelou, parcialmente, confirmando que a evolução continuará: “O que está sentado no trono declarou então: ‘Eis que eu faço novas todas as coisas’” (Ap 21, 5).

Humanoritmo e a emergência do Reino de Deus

A leitura é importante para obtenção e ampliação de conhecimento, e boa leitura é fundamental para que o conhecimento adquirido seja correto, aprimorado e aperfeiçoado.

Outra forma de aquisição do saber é pela tradição oral, como ocorre, e ocorria, principalmente, quando os sábios e/ou anciãos transmitem(iam) suas experiências às gerações mais novas. Aliás, como ninguém nasce sabendo ler e escrever, o primeiro aprendizado é sempre oral.

O estudo de textos escritos é mais rápido e mais frio, em comparação com o aprendizado oral, e este também pode ser alterado durante o passar do tempo, pelos diversos ruídos provocados durante a comunicação. Um dos principais ruídos, se não o principal, decorre da dissonância entre o significado falado e o manifesto pelo comportamento daquele que emite o discurso. Os vícios humanos acabam, desse modo, se transferindo para a tradição oral, deturpando o conhecimento original que deveria ser transmitido.

Isso ocorreu no tempo dos judeus, quando Jesus Cristo contestou a tradição das autoridades de seu tempo. “Os escribas e fariseus estão sentados na cátedra de Moisés. Portanto, fazei e observai tudo quanto vos disserem. Mas não imiteis as suas ações, pois dizem, mas não fazem” (Mt 23, 2-3).

A divergência entre discurso e ação continuou na chamada Idade Média, em que assassínios, explorações humanas e guerras sob o argumento de serem ações em nome de Deus, do Deus Cristão, ocorreram amplamente, quando a mensagem de Jesus Cristo é de Justiça, de santidade, de perdão e de amor ao próximo.

Atualmente, no mesmo sentido, a política internacional e as políticas nacionais são dominadas pelos discursos mentirosos, reina a pós-verdade, como regra, inclusive pelos meios de comunicação oficial, pela grande mídia, com seus interesses, muitas vezes escusos, falseando as notícias.

E aqueles que deveriam nos mostrar, mostrar ao público, a Verdade, os cientistas e os religiosos, também transmitem conhecimentos equivocados, ainda que parcialmente corretos, mais por inconsciência e ignorância do que por má-fé, o que não ocorre, majoritariamente, no meio político.

Daí a importância da leitura, como salientado. Faço esta introdução porque leio neste momento “A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas”, de Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A obra de Fritjof Capra foi fundamental para minha formação intelectual, por meio da qual fui introduzido à física moderna, lendo “O Tao da Física” e depois “O Ponto de Mutação”. O problema de Capra, e de muitos cientistas e religiosos modernos, é não conhecer a profundidade da doutrina de Cristo, que alcança a mais pura ciência, porque Cristo é a Razão, é o Logos.

Talvez por isso Olavo de Carvalho tenha sido tão crítico a Capra em “A Nova Era e a Revolução Cultural”, questionando a proposta de mudança das tradições por Capra e Gramsci. Se o caos social provocado pelas ideias comunistas de Gramsci, tentando destruir a família e as tradições Cristãs, são evidentes; de outro lado, a mudança na perspectiva da ciência em relação à realidade mais profunda é necessária, pois aponta para a Verdade Cristã, para a Unidade material e espiritual do Cosmos. São Paulo entendeu isso muito bem: “Há um só Corpo e um só Espírito, assim como é uma só a esperança da vocação a que fostes chamados; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; há um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos” (Ef 4, 4-6).

Há um só Cosmos, há um só Logos. Por isso, o fator Jesus Cristo é essencial, pois define a humanidade plena, unida ao universo, que age pelo Espírito Santo, pela Razão Santa, pela Razão Plena, pela Razão Cósmica. Só Jesus Cristo salva é uma Verdade ontológica, pois o nome “Jesus” tem o significado de “Deus Salva”, e “Cristo” é aquele que recebe a unção com o Espírito de Deus, que é Logos, é racional, portanto Jesus Cristo mostrou o caminho da salvação, individual e coletiva, encarnado e entregando sua vida à Vida, à Razão Plena, à Inteligência completa, e só Jesus Cristo salva porque apenas o Logos salva, na medida em que qualquer pessoa razoavelmente esclarecida sabe que burrice mata, a ignorância mata, e atualmente é possível que a ignorância mate mais que a própria maldade pura.

A Unidade física e espiritual do Cosmos, hoje descoberta pela física, já era conhecida por Jesus Cristo, que explorou sua humanidade em plenitude, percebendo que a Humanidade é Una, é uma, Unidade que Ele recebeu pelo Espírito Santo de Deus, recebeu de cima, do Pai, do Logos, a totalidade original e emergente na humanidade em Jesus Cristo.

Ao contrário da ciência contemporânea, que se ampara em números, estatísticas e algoritmos, Jesus Cristo se apegou às pessoas, amou a todos, conhecendo seus comportamentos, seus ritmos, a ciência de Jesus Cristo é baseada em humanoritmos, no cálculo de sentimentos e ações humanas, na contagem do tempo humano, nos cálculos dos comportamentos das pessoas, individual e coletivamente, nas eras ou éons da humanidade.

Pleno conhecedor da visão sistêmica da vida, da teoria do caos, Jesus sabe que a única forma de controle social possível está na educação, na obediência à Lei e ao Seu Espírito, no conhecimento de Deus, de Sua Vontade, do Logos, e na ação conforme esse saber, por vontade interna das pessoas.

Na concepção sistêmica existe o conceito de “propriedades emergentes”, que “são as propriedades novas que surgem quando um nível superior de complexidade é atingido ao se reunir componentes de complexidade inferior” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 198).

Pode-se entender que o Reino de Deus é uma propriedade emergente da atividade de Jesus Cristo sobre o planeta, depois de cumprir sua missão como Ungido de Deus, encarnando o Logos, Ele difundiu Seu Espírito, pela cruz, e criou condições para a realização do Reino, época em que as pessoas pautarão suas vidas por um nível superior de humanidade que apenas o Pai sabe quando ocorrerá. “Uma escola de pensamento afirma que as propriedades do nível hierárquico superior não são, em princípio, dedutíveis dos componentes do nível inferior” (Idem, pp. 200/201).

O livro de Capra também fala da teoria de Gaia, da hipótese do planeta como um ser vivo. Contudo, essa hipótese pode ser tida como limitada, sendo mais adequado ver todo o Universo, o Cosmos, como um sistema vivo, proposta que pode ser inferida de “Universo Autoconsciente”, de Amit Goswami.

Parece que é essencial reconhecer o estabelecimento da ética e valores como atividades científicas autênticas.

Desenvolvimentos recentes na física quântica já sugerem a possibilidade de uma contribuição fundamental da física em geral para essa questão. O experimento de Alain Aspect indica conclusivamente que nossa separatividade do mundo é uma ilusão. Com base apenas nesses dados, algumas pessoas acham, corajosamente, que a visão quântica do mundo permite, e mesmo exige, ética e valores.

Temos condições de ir ainda mais longe com a interpretação idealista da mecânica quântica. Uma vez que possamos compreender a camuflagem condicionada tolda os mecanismos hierárquicos entrelaçados de nosso cérebro-mente e cria a ilusão da separatividade do ego, basta apenas mais um passo para criar uma ciência da ética que nos permite viver em harmonia com o princípio, cientificamente comprovado, da inseparabilidade. No desenvolvimento de tal programa, poderá ser muito útil nossa herança espiritual/religiosa. Uma ponte entre as filosofias científicas e espiritual do idealismo eliminará realmente as divisões na sociedade que desafiam e quase sempre comprometem ética e valores” (GOSWAMI, Amit; REED, Richard E.; GOSWAMI, Maggie. O universo autoconsciente: como a consciência cria o mundo material. Trad. Ruy Jungmann. São Paulo: Aleph, 2007, pp. 302/303, grifo nosso).

O que faltou a Goswami, portanto, foi a correta compreensão da doutrina Cristã, faltante até mesmo nas igrejas Cristãs, que é exatamente essa ética da Unidade Humana, do Logos, em que ação individual é pautada por uma razão solidária, por uma razão coletiva, também nos âmbitos políticos e jurídicos.

Niklas Luhmann faz uma interessante abordagem sistêmica da sociedade em sua “Sociologia do Direito”, mas falta a ele o fator Jesus Cristo, o fator Espírito Santo, no nível da religiosidade profunda, da unidade cósmica, pelo qual as expectativas normativas dos indivíduos, a forma como entendem que ocorrerão regularmente os comportamentos sociais, são superadas pelas suas expectativas cognitivas, em que o conhecimento do Logos, de Deus, leva ao conhecimento da Lei. Esse fator, como ele reconhece, está em “nível pré-normativo” indiferenciado, na “camada elementar de expectativa”, “no sentido de que os componentes cognitivos e normativos das expectativas formam uma unidade coesa” (Niklas Luhmann. Sociologia do Direito I. Trad. Gustavo Bayer. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 1983, p. 60). Daí porque no sistema de Luhhmann não emerge, após a batalha escatológica, o Reino de Deus, em que vigora a Lei da Liberdade, pelo fato de ele ignorar a humanidade mais profunda, por desconhecer o humanoritmo.

Jesus Cristo é o Filho do Deus Vivo, que interage até com as forças da Natureza, é a Vida que surge da vida humana, a nova humanidade, a humanidade emergente, que se sente como membro cósmico ativo.

O que causa a ação de Cristo não é sua vontade individual, mas a Vontade do Pai, é a ação pela causalidade vertical indicada por Wolfgang Smith, como narrado em artigos anteriores (https://holonomia.com/2016/09/05/jesus-e-o-jogo-da-vida-eterna-verdade-e-consequencia/ e https://holonomia.com/2017/01/26/determinismo-ideologico-ou-espiritual/).

Capra fala de causação descendente, ou de cima para baixo, que “significa que o nível hierárquico superior afeta as propriedades dos componentes inferiores”, havendo “discussões na literatura filosófica a respeito da relação entre emergência e causação descendente – também chamada de macrodeterminismo”. “Considere a progressão dos níveis hierárquicos sociais que vão dos indivíduos para a família, para a tribo, para a nação. É claro que uma vez que os indivíduos estão em uma família, as regras da família afetam e mudam o comportamento dos indivíduos; de maneira semelhante, pertencer a uma tribo afeta o comportamento da família, e assim por diante” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 201).

Como Goswami, e mesmo Capra, perceberam, nós estamos conectados ao Cosmos, sendo que em Jesus Cristo essa conexão é plena, ele possui o Espírito Santo, É o Universo Autoconsciente, consciência causada descendentemente, nascida de cima, o que já havia se manifestado parcialmente nos profetas, antecipando a ordem social emergente decorrente da unificação da humanidade.

Essa Verdade é proclamada há quase dois mil anos, como ideias defendidas inicialmente por marginalizados e excluídos sociais; porque as únicas que dão a liga da unidade humana e social, tais ideias ascenderam aos princípios fundamentais da civilização, e quando seu autêntico Espírito prevalecer, causando descendentemente o bom comportamento dos indivíduos, o Reino de Deus será real e visível.

A unificação da razão humana tem como propriedade emergente o sistema social antecipado conceitualmente como Reino de Deus, que está próximo…