Alma e física

No artigo anterior foram expostas três hipóteses básicas quanto à natureza da alma: a materialista, pela qual a alma é fruto de criação da mente humana ociosa, um epifenômeno da atividade cerebral; a dualista, que entende a alma como distinta do corpo, imaterial e imortal, separando-se do corpo após a morte; e a monoteísta, que concebe a alma como uma integralidade que inclui a realidade física da pessoa, o corpo e os sentimentos.

No presente texto são desenvolvidos argumentos sobre os aspectos materiais e físicos da alma, adequados à visão Cristã, segundo a qual “Há um só Corpo e um só Espírito, assim como é uma só a esperança da vocação a que fostes chamados; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; há um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos” (Ef 4, 4-6).

Ainda que haja dúvidas sobre a autoria da Carta aos Efésios, seu conteúdo é compatível com o Evangelho de Jesus Cristo, fazendo parte do cânon amplamente aceito do Novo Testamento, pelo que pode ser assumido como correto o conceito teológico acima, indicando que há um só Corpo e um só Espírito, ideia corroborada pela física moderna, conforme a qual todos os corpos estão interconectados por campos infinitos que interferem em entre si, havendo, pois, um só Corpo, que Einstein chamaria de contínuo espaço-tempo. A existência de um só Espírito, de sua vez, por ora, é uma inferência lógica, uma pressuposição científica, na medida em que a compreensão do mundo, e de todos os seus diversos fenômenos, e a comunicação humana, por exemplo, indicam haver uma Inteligência unitária pela qual os fenômenos espirituais são produzidos e podem ser captados em sua interconexão mais profunda, uma espécie de tradutor lógico universal que aponta para uma unidade sutil que tudo inclui, o Logos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos.

Aristóteles estabeleceu a necessidade de uma causa primeira, o motor imóvel que tudo move, para que seja possível a compreensão filosófica do mundo e seu movimento. A alma, porque ligada ao Espírito, integra a causa primeira, manifestando-a no tempo, é nossa presença na causa primeira, conectando-nos ao começo de tudo.

A alma, portanto, liga-se ao Espírito: “Ou não sabeis que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que está em vós e que recebestes de Deus? … e que, portanto, não pertenceis a vós mesmos?” (1 Cor 6, 19).

A criação das almas antecede o tempo, no aspecto da alma que está unido ao Espírito, e ocorre no tempo, quando se forma em um corpo físico na existência humana, dentro na História do Universo.

Desta feita, Deus nos cedeu parte de Seu Espírito indivisível, para que vivamos, e esse momento, de criação das almas, é atemporal, e talvez signifique o próprio princípio do tempo, o salto quântico inicial pelo qual o universo e o tempo foram formados, quando todas as almas interagiram no Espírito, com livre-arbítrio, determinando suas naturezas, e seus destinos, na existência. Por isso, já existimos desde antes do mundo.

Nele (em Cristo) Ele (Deus) nos escolheu antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis diante dele no amor” (Ef 1, 4).

Vinde, benditos de meu Pai, recebei por herança o Reino preparado para vós desde a fundação do mundo” (Mt 25, 34).

Pode-se dizer que, em uma análise regressiva do tempo, há um salto quântico para a unidade de tudo, a singularidade, quando não havia espaço ou tempo e todas as almas e todos os corpos estavam unidos entre si em um único ponto, no Espírito. Na contagem retroativa do tempo, a matéria se torna sutil dando saltos quânticos até chegar à unidade infinita, imaterial, atemporal e aespacial, segundo nossos conceitos científicos de matéria, tempo e espaço.

A criação é, portanto, o momento em que a unidade se transforma em diversidade, o uno se torna múltiplo, quando a causa primeira, o motor imóvel, sem se mover, sem perder sua Unidade, dá início ao movimento. A alma está no movimento, e antes do movimento, simultaneamente. Antes do tempo, a alma escolhe seu movimento essencial, sua natureza, e por isso é permitido afirmar, como medida de justiça, que os eleitos escolhem ser escolhidos, sendo a Justiça e a Perfeição alguns dos atributos de Deus

A Unidade primordial é imemorial, porque anterior ao tempo, no qual são formadas as memórias, mas é acessível à alma de uma forma em que as noções de tempo, espaço e individualidade são ofuscadas, de modo que essa unidade é, como regra, inconsciente. Essa unidade é associada à dissolução do eu nas religiões orientais. De outro lado, há a Unidade memorial, que é o julgamento final das religiões monoteístas, quando todos os movimentos são lembrados desde o início do tempo, no Espírito, cuja comunhão ou unidade será trazida à consciência das almas, sendo mantidas suas individualidades, segundo a qualidade de seus movimentos e conforme os respectivos conhecimentos potenciais e razoáveis daquela Unidade.

Se é possível à humanidade compreender a união física entre duas partículas quanticamente entrelaçadas, o que faz dos movimentos dessas partículas espacialmente separadas um único movimento físico que determina a posição de ambas, independentemente da distância entre elas, a mesma lógica vale para a situação das almas em relação ao Espírito, quando da medição final de seus movimentos.

Outrossim, a alma se posiciona simultaneamente no Ser e no estar, possuindo natureza permanente, que é, sempre foi e sempre será; mas encontra-se, enquanto encarnada, no devir; pelo que as relações com as outras almas ocorrem tanto na eternidade quanto no tempo.

A alma pode dizer “eu sou” porque estava presente na fundação do mundo, fundação na qual, pela unidade inerente ao Ser, decorrente do princípio da unidade do Ser (que é até mesmo conceitual), também se estabeleceu o futuro, o Reino de Deus, que significa a unidade consciente da humanidade.

A função da alma é, portanto, restabelecer conscientemente a unidade primordial, o Logos, que é sempre Uno, no tempo, mantendo a unidade no devir, conforme o Logos, unidade que no plano atemporal é determinada, pré-determinada pela escolha feita pela alma antes do tempo, pois possuidora do livre-arbítrio, ainda que no plano do devir essa unidade e essa escolha não estejam na consciência superficial e sejam de difícil elaboração e descoberta racional. A busca dessa unidade consciente é trabalho da Filosofia, da Ciência e da Religião, que representam momentos históricos do Espírito em busca da Verdade, até que a Unidade seja alcançada conjuntamente por tais abordagens cognitivas, e também na Política, o que representa o Reino de Deus.

Não rogo somente por eles, mas pelos que, por meio de sua palavra, crerão em mim: a fim de que todos sejam um. Como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, que eles estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes dei a glória que me deste para que sejam um, como nós somos um: Eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que me enviaste e os amaste como amaste a mim” (Jo 17, 20-23).

Por isso, quando criadas as almas no Ser, seu devir já foi todo ele determinado, pelo movimento da alma dentro da unidade que se mantém, diante da relação necessária de completude na unidade do Ser.

A unidade inconsciente só se torna totalmente consciente quando a alma volta ao Ser depois de experimentar o seu pleno devir, na encarnação, que é o movimento completo do vivo na Vida, sendo possível atingir parte dessa consciência maior ainda em vida, antecipando, com fé e conhecimento, a vivência da Unidade do Ser.

A Unidade do Ser pressupõe um Sujeito fixo, que é o motor imóvel, o Espírito, Deus, ou Logos, que estava no Princípio. O conhecimento, igualmente, exige algo permanente, porque sem uma referência estável o conhecimento seria impossível, na medida em que nossas opiniões e sensações mudariam o tempo todo, não permitindo a fundamentação científica.

A Verdade pressupõe e exige um Sujeito eterno que compare os movimentos, relacionando-os entre si, como o faz a Tradição. O Sujeito eterno é Deus, que nos julga fora do tempo, mas dentro do tempo esse julgamento é feito com base no modelo de movimento eterno, dado por Jesus Cristo, e por isso ele é o juiz da humanidade, pois uniu sua subjetividade à de Deus, tornando-se o primeiro Sujeito Humano em plenitude.

Desta feita, a Verdade é uniplurissubjetiva, relativa à subjetividade que permanece em vários sujeitos, mesmo diante da constante mudança material e temporal, independentemente do ponto de vista, que é múltiplo, daí a uniplurissubjetividade, que resgata a Unidade imemorial e antecipa a Unidade memorial, vivendo conforme O Espírito.

A alma busca a Verdade no sentido de se alinhar ao motor imóvel primordial, Deus, da qual é oriunda, unindo-se a Ele em seus movimentos locais, de modo que estes se tornem os movimentos da unidade imóvel, do Espírito.

Daí porque o Espírito Santo é a alma do corpo coletivo. A alma grande, ou grande alma, mahatma, é a que usa o livre-arbítrio para escolher o princípio de movimento individual não a partir do corpo pessoal e dos prazeres corporais, e sim conforme o Espírito Santo, porque age em benefício do Corpo coletivo.

O propósito da alma, pois, é crescer em conhecimento e grandeza espiritual para agir no mundo físico e social, resgatando a Unidade imemorial e permitindo que a Unidade memorial se manifeste no Corpo físico da Humanidade, para que esta viva como um só Corpo e um só Espírito, deixando para os filhos da Humanidade, já aqui e agora, e também como herança, o Reino preparado para os justos desde a fundação do mundo.

Alma

Alguns conceitos são essenciais para a compreensão do mundo, porque ligados às ideias fundamentais ou categorias pelas quais captamos intelectualmente a realidade.

Sistemas filosóficos distintos possuem conceitos ou categorias simbólicas diferentes, de modo que a utilização de determinados termos em um discurso depende da inserção de seu significado dentro do contexto, não podendo palavras de um sistema de pensamento serem usadas indistintamente em outro.

A palavra alma está incluída nessa hipótese, pois sua significação depende de uma determinada posição filosófica ou teológica. Assim, no novo dicionário Aurélio da língua portuguesa, em sua 4.ª edição, por exemplo, o vocábulo alma possui 26 (vinte e seis) significações “1. Princípio de vida. 2. Filos. Entidade a que se atribuem, por necessidade de um princípio de unificação, as características essenciais à vida (do nível orgânico às manifestações mais diferenciadas da sensibilidade) e ao pensamento, e que se define em oposição ao corpo (embora não necessariamente a matéria) e, às vezes, a espírito, estando associadas à consideração da ideia de alma as questões da imortalidade, da personalidade, da individualidade, da consciência, etc., com todas as implicações morais, religiosas e metafísicas que elas suscitam (…). 3. Princípio espiritual do homem concebido como separável do corpo e imortal (…). 12. Pessoa, indivíduo”.

Teologicamente, portanto, alma pode ter vários sentidos, dentre os quais merecem ser destacados três: um segundo o qual a alma é uma entidade imaterial e imortal que se une ao corpo em vida, do corpo se separando após a morte, segundo uma concepção dualista do mundo; outra entendendo que a alma é uma questão psicológica, decorrente dos estados neurais da pessoa, sendo uma ilusão ou criação da mente que se extingue com a morte, conforme a vertente filosófica e teológica materialista; e outra decorrente da tradição hebraica, segundo a qual alma é a própria pessoa.

Para entender essa última concepção, em contraposição com a primeira, vale assistir ao vídeo “Estudo da palavra: Nephesh – ‘Alma’” produzido por “The Bible Project”, com legenda em português (https://www.youtube.com/watch?v=g_igCcWAMAM). Ficam recomendados, a propósito, todos os vídeos de “The Bible Project”, uma vez que já assisti a vários, ainda que nem todos tenham legenda em português, salientando-se que o projeto explica a Bíblia segundo uma perspectiva Cristã, com certa neutralidade teológica, dentro das possibilidades de uma atividade qualquer que possa ser neutra, sustentando que a Bíblia é uma história única que leva a Jesus.

Segundo o vídeo, a palavra nephesh constante do Antigo Testamento foi traduzida, de forma infeliz, como alma, porque o termo alma é carregado de bagagem da filosofia grega, uma vez que no sistema de pensamento helênico a alma seria uma essência não física e imortal da pessoa, que está presa ao corpo, do qual é liberada após a morte, como na ideia do “fantasma dentro da máquina”.

“–– Não é outra coisa (a morte) senão a separação da alma do corpo, não é? Estar morto é bem isto: de um lado, separado da alma, o corpo isola-se em si mesmo; do outro, a alma, por sua vez, separada do corpo, é isolada em si mesma? Ou a morte será outra coisa?

–– Não, é isso mesmo, disse ele.” (Platão. Fédon. Trad. Miguel Ruas. São Paulo: Editora Martins Claret, 2005, p. 27).

Tem-se, pois, na filosofia platônica uma concepção dualista do mundo, com duas realidades, dos corpos e das ideias, sendo fato histórico que Agostinho de Hipona viveu em um tempo sob forte influência filosófica do neoplatonismo, tendo, então, desenvolvido sua proposta teológica com as categorias das duas cidades, também podendo-se inferir que o dualismo cartesiano, e suas duas substâncias, possui ligação com filosofia platônica.

Platão entendia que a alma, “apresentando-se em um corpo, faz com que ele seja vivo” (Idem, p. 90), sendo imortal e indestrutível, indo ao Hades após a morte do corpo.

A separação entre alma e corpo sustenta, por sua vez, o desenvolvimento da ideia da reencarnação, metempsicose ou transmigração das almas, que é divergente do ensinamento bíblico pelo qual “é um fato que os homens devem morrer uma só vez, depois do que vem um julgamento” (Hb 9, 27).

Outrossim, tal concepção grega não tem correspondência com a ideia hebraica de nephesh, palavra que, para a Bíblia, pode significar “garganta” ou a pessoa inteira. Na Bíblia, a pessoa não tem uma alma, ela é uma alma, nephesh, um ser vivo e físico que respira, em um corpo.

O conceito de alma, destarte, é um para os gregos e outro conforme o entendimento bíblico do mundo. Resumindo, para os materialistas alma é um conceito fruto do excesso de conexões neurais, da imaginação de um cérebro ocioso, mera criação da imaginação humana; dentro de uma filosofia dualista, alma é o princípio que dá vida ao corpo, do qual se separa após a morte deste; enquanto para o hebreu a alma é a própria pessoa em sua integridade, incluindo seus sentimentos e sua realidade física, havendo uma unidade entre corpo e alma.

Portanto, o conceito de ressurreição é diferente daqueloutro de reencarnação, no sentido de retorno físico da pessoa integral em um corpo físico renovado, havendo, nesse aspecto, um significativo hiato ontológico entre a Teologia bíblica e a grega, sem prejuízo de uma proximidade prática entre tais visões de mundo, “na realidade, agora que a alma se revelou imortal, não há nenhuma saída para seus males, nenhuma outra salvação, senão a de se tornar a melhor possível e a mais sábia” (Platão. Obra citada, p. 93).

Ainda que Platão sustente tal ideia para que a alma chegue ao Hades em boas condições, sem se prejudicar, referido entendimento tem pertinência com o entendimento bíblico segundo o qual devemos buscar a santidade, tornando-nos a melhor e mais sábia alma possível, conforme o modelo de Deus: “Sede santos, porque eu, Iahweh vosso Deus, sou santo” (Lv 19, 2)

Nesse sentido, o mandamento de Moisés, ensinamento repetido por Jesus, deve ser corretamente interpretado dentro do contexto bíblico e suas categorias fundamentais da realidade:

Ouve, ó Israel, Iahweh nosso Deus é o único Iahweh! Portanto, amarás a Iahweh teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua força” (Dt 6, 4-5).

Amar a Deus com toda a alma, ou nephesh, significa dedicar toda a existência física ao Criador, incluindo todos os pensamentos, palavras e ações, todos os movimentos internos e externos da pessoa devem ser santos, puros, adotados para realizar o Bem, e oferecer todo o ser, com todas as suas capacidades e limitações, para amar, e servir, a Deus e ao próximo como a si mesmo.

Na tradição bíblica, assim, existe uma unidade inseparável entre corpo e alma, entre o mundo e Deus, sendo ilusória a ideia de distinção entre a realidade física e a espiritual, dada a ligação direta entre o que fazemos no corpo e o julgamento na eternidade, pelo que o corpo integra a eternidade e a alma é una com o corpo.

Por isso, devemos ampliar nossa alma, para manter a unidade com o mundo, tornando-nos mahatamas, grandes almas, almas coletivas, que têm comportamento solidário, sendo “luzes no mundo, mensageiros da Palavra de vida”, porque as grandes almas cuidam dos outros com amor.

Portanto, pelo conforto que há em Cristo, pela consolação que há no Amor, pela comunhão no Espírito, por toda ternura e compaixão, levai à plenitude a minha alegria, pondo-vos acordes no mesmo sentimento, no mesmo amor, numa só alma, num só pensamento, nada fazendo por competição e vanglória, mas com humildade, julgando cada um os outros superiores a si mesmo, nem cuidando cada um só do que é seu, mas também do que é dos outros” (Fl 2, 1-4).

Elias e a verdade científica

Elias é uma personagem bíblica que surgiu no tempo do rei Acab, em um período de idolatria, quando o rei “passou a servir Baal e a adorá-lo”, “irritando Iahweh, Deus de Israel, mais que todos os reis de Israel que o precederam” (1Rs 16, 31 e 33).

Nessa época, pois, o poder político de Israel estava submetido a uma falsa teologia e a ideias desviantes da verdade, propagadas por falsos profetas. Fazendo uma adequação teórica ao tempo atual, os profetas do tempo de Elias, o que vale também para este profeta, correspondiam aos cientistas e acadêmicos (e religiosos) da era atual, aqueles que sustentam uma narrativa de mundo com pretensão de verdade. A diferença entre o profeta (cientista ou religioso) de Iahweh e o falso profeta (cientista ou religioso) está no fato de que aquele é expressão da Verdade, enquanto este é pregador da mentira e do engodo. As previsões do autêntico profeta, ou cientista, ou religioso, se realizam e se cumprem no mundo da vida.

A figura de Elias possui elevado destaque no antigo testamento, sendo que profetizou uma seca de três anos e ressuscitou o filho de uma viúva (1Rs 17, 1 e 22), antecipando sinais que seriam realizados pelo próprio Jesus Cristo, que controlou a tempestade e também ressuscitou pessoas, como narrado nos Evangelhos.

Um dos eventos mais marcantes da vida de Elias é o embate com os quatrocentos e cinquenta profetas de Baal, no monte Carmelo, quando os desafiou a invocar o nome de deus, enquanto ele invocaria Iahweh, e o deus que respondesse enviando fogo, “é ele o Deus” (1Rs 18, 24). Aceito o desafio, os profetas de Baal passaram metade do dia pedindo a seu deus, mas o fogo de sua oferenda não foi aceso. Então, Elias “empilhou a lenha, esquartejou o novilho e colocou-o sobre a lenha. Depois disse: ‘Enchei quatro talhas de água e entornai-a sobre o holocausto e sobre a lenha’; assim o fizeram. E ele disse: ‘Fazei-o de novo’, e eles o fizeram. E acrescentou: ‘Fazei-o pela terceira vez’, e eles o fizeram. A água se espalhou em torno do altar e inclusive o rego ficou cheio d’água. Na hora em que se apresenta a oferenda, Elias, o profeta, aproximou-se e disse: ‘Iahweh, Deus de Abraão, de Isaac e de Israel, saiba-se hoje que tu és Deus em Israel, que sou teu servo e que foi por ordem tua que fiz todas estas coisas. Responde-me, Iahweh, responde-me, para que este povo reconheça que és tu, Iahweh, o Deus, e que convertes os corações deles!’ Então caiu o fogo de Iahweh e consumiu o holocausto e a lenha, secando a água que estava no rego. Todo o povo o presenciou; prostrou-se com o rosto em terra, exclamando: ‘É Iahweh que é Deus! É Iahweh que é Deus!’ Elias lhes disse: ‘Prendei os profetas de Baal; que nenhum deles escape!’ e eles os prenderam. Elias fê-los descer para perto da torrente do Quison e lá os degolou” (1Rs 18, 33-40).

Elias mostrou, assim, que estava do lado da verdade científica, da Verdade, derrotando os falsos profetas, porque a palavra de Elias era adequada às coisas, sendo dotada de adaequatio intellectus et rei, de identificação entre o intelecto e a coisa, a ideia e a existência, o pensamento e a realidade.

Atualmente, a verdade científica é encontrada, mesmo que parcialmente, por meio das previsões das teorias científicas, notadamente quando são confirmadas, ocasiões em que o intelecto se apresenta no mundo dos fatos, ainda que restritamente, dado que a plena adequação só ocorre nas manifestações do próprio Deus, na verdadeira Ciência, o Cristianismo, de que os profetas (e religiosos) de hoje estão muito distantes.

A teoria da relatividade, nesse sentido, é uma expressão parcial e muito limitada da adequação entre ideia e realidade, como ocorreu com a recente comprovação da existência de ondas gravitacionais pela proposta científica de Einstein. Parcial porque nem Einstein, nem qualquer outro cientista posterior, conseguiu compatibilizar a relatividade com a física quântica.

O problema de Einstein foi sua fixação com o materialismo, que pode ser considerado uma nova forma de teologia, pelo que Einstein, nesse sentido, é um profeta do materialismo, tendo ele procurado eliminar os “conceitos provenientes da esfera psicológica, como dor, meta, finalidade etc.” do pensamento científico, pois este deve tratar apenas de “conceitos ‘de natureza espacial’, buscando expressar por meio deles todas as relações que possuem caráter de lei”, reduzindo os fatos “de tal maneira que o psíquico como tal seja eliminado do encadeamento causal do ser, de modo que ele, por conseguinte, não se manifeste em parte alguma como um elo independente nas ligações causais. Esta atitude, que em princípio considera possível abranger todas as relações empregando exclusivamente conceitos de ‘natureza espacial’, é certamente o que entendemos hoje por ‘materialismo’ (depois que a ‘matéria’ perdeu seu papel de conceito fundamental)” (Albert Einstein. A Teoria da Relatividade Especial e Geral. Trad. Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto, 1999, pp. 116-117).

A busca final de Einstein era pela descrição da “realidade física de maneira exaustiva (incluindo o espaço a quatro dimensões) por meio de um campo”, em uma “teoria de campo relativístico”, objetivo não compartilhado pelos físicos de seu tempo, acreditando estes que “o estado de um sistema não pode ser caracterizado direta mas apenas indiretamente”, através de estatísticas, porque predomina a “convicção de que a natureza dupla (estrutura corpuscular e estrutura ondulatória), solidamente provada pela experiência, só pode ser alcançada através desse enfraquecimento do conceito de realidade” (Idem, p. 130).

Pode-se ver que Einstein procurava uma ciência dissociada do aspecto humano, porque a exclusão da dor (e consequentemente do prazer), da meta, da finalidade, enfim, do sentido das coisas e do âmbito psíquico do pensamento científico é produzir uma ciência sem humanidade. A Ciência produzida dessa forma é estéril, é morta, porque sem Metafísica, sendo mister, para a busca da verdade científica, a superação do materialismo e do positivismo, que rejeitam a ideia de uma realidade espiritual e significado e negam os valores humanos que fazem a vida ter sentido.

Nos anos 30, o reducionismo ocupava uma parte importante do programa neopositivista que aspirava alcançar a unidade da ciência pela redução de seus diversos ramos à linguagem fisicista. As entidades ou níveis mais altos não seriam ‘outra coisa que’ a soma das entidades ou teorias de níveis mais baixos. Este projeto tropeçou de imediato em dificuldades insuperáveis, mas os intentos reducionistas não cessaram” (Carlos A. Casanova. Física e Realidade: reflexões metafísicas sobre a ciência natural. Trad. Raphael D. M. De Paola. Campinas, SP: VIDE Editoral, 2013, p. 210).

Casanova defende, com absoluta razão, que é preciso pressupor inteligibilidade na natureza para que seja possível a atividade científica, atitude esta que é previa à própria empreitada científica, a qual “se encontra num universo de sentido que a transcende. (…) Quando, em nome da ciência natural, se pretende negar este universo de sentido, já não se está fazendo ciência, mas metafísica, ainda que mascarada e falsa” (Idem, p. 245).

A verdade científica, assim, está longe de ser alcançada pelos profetas do materialismo, por maior que tenha sido o seu sucesso parcial provisório, como ocorreu com os profetas de Baal até o embate com Elias. A vida de Elias é inacreditável para um materialista, especialmente porque aquele simplesmente não morreu, pois quando estava com Eliseu, “aconteceu que, enquanto andavam e conversavam, eis que um carro de fogo e cavalos de fogo os separaram um do outro, e Elias subiu ao céu no turbilhão” (2Rs 2, 11).

A opção pelo Cristianismo na busca da verdade científica é, portanto, insólita, contrariando tudo o que se tem entendido como ciência, e como religião, mas não afronta os dados científicos em si, em uma interpretação não reducionista da Natureza. Essa visão científica mais ampla da realidade, de todo modo, como uma expressão própria da Ciência, depende de uma comprovação pública da teoria em algum momento, como ocorreu com a relatividade, e com Elias, diante dos profetas de Baal.

Elias, destarte, está relacionado à manifestação da verdade científica, como profetizado: “Eis que vos enviarei Elias, o profeta, antes que chegue o Dia de Iahweh, grande e terrível. Ele fará voltar o coração dos pais para os filhos e o coração dos filhos para os pais, para que eu não venha ferir a terra com anátema” (Ml 3, 23-24).

O espírito, padrão, ideia, arquétipo ou forma de verdade de Elias se manifestou antes de Jesus Cristo, na vida de João Batista, antecipando a revolução teológica que viria a se desenvolver tanto no Cristianismo como no Islamismo, religião esta diretamente dependente da Verdade contida na Torá e no Evangelho, até que o início da consumação dessa Verdade se dê também no plano político internacional.

Os discípulos perguntaram-lhe: ‘Por que razão os escribas dizem que é preciso que Elias venha primeiro?’ Respondeu-lhes Jesus: ‘Certamente Elias terá de vir para restaurar tudo. Eu vos digo, porém, que Elias já veio, mas não o reconheceram. Ao contrário, fizeram com ele tudo quanto quiseram. Assim também o Filho do Homem irá sofrer da parte deles’. Então os discípulos entenderam que se referia a João Batista” (Mt 17, 10-13).

João Batista pregava: “Mudai de mentalidade, pois ficou próximo o reino dos céus” (Mt 3, 1). Anunciava uma realidade que ainda não é bem compreendida, porque exige uma interpretação do mundo que transcende a aparência fugaz do plano corporal, uma nova mentalidade, visão de mundo ou Metafísica que inclua uma temporalidade ligada à escala da evolução da vida humana na Terra, mensagem que deve submeter o poder político internacional a partir de Israel e seu Messias, Jesus.

Para isso, é fundamental a correta interpretação da relatividade e da física quântica, da Ciência, que corrobora a Verdade Cristã, uma vez que passou a exigir que o mundo seja entendido não como um espaço cheio de coisas atomicamente isoladas ou como objetos exteriores, mas como relações, infinitas, como funções, como valores, vinculados ao observador, ao sujeito que é templo de um Espírito infinito, de um Logos que perpassa todas as coias. A posição relativa é fundamental para a compreensão da relatividade, exigindo a orgânica quântica, contudo, a definição prévia de um valor, de uma utilidade da observação, no sentido de verificar o fenômeno a ser observado, ou em razão de sua natureza como onda ou como partícula, dando propriamente sentido às coisas no plano espaço-temporal.

O que o materialismo de Einstein não percebeu, como também escapou ao positivismo, é que o mundo material é feito não de coisas extensas, mas de Espírito encarnado, como O Logos, A Razão, Deus, entre os homens e a natureza. Sem Espírito, sem alma, sem o sentido do movimento, a matéria é morta, é indiferente, é insossa, e isso não provoca atividade no organismo vivo.

Também fundamental é a correta interpretação do Cristianismo, como Judaísmo renovado, e do Islamismo, e por isso busca-se restaurar o espírito de Elias, anunciando o Reino de Deus, indicando o caminho de restauração da Verdade Científica, mesmo que essa Mensagem não seja bem compreendida, confusão que cessará quando o Espírito de Cristo se manifestar, de forma semelhante ao fogo descendo no monte Carmelo, para que os falsos profetas, materialistas e positivistas, sejam desmascarados, servindo como escabelo para a proclamação do Evangelho, submetendo o poder político e a atividade científica e acadêmica à Verdade da Ciência, que é Cristo.

Hierarquia das Ciências

A questão sobre a existência de uma hierarquia das ciências é abordada no livro “Física e Realidade – Reflexões metafísicas sobre a ciência natural”, de Carlos Augusto Casanova, professor da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Chile, em que o autor perquire a existência de uma ciência primeira, valendo-se dos ensinamentos de Aristóteles e sua Metafísica.

Concordo com o autor quando ele sustenta, baseando-se em Aristóteles, que a Metafísica é condicionante para o exercício da atividade científica, funcionando como um pressuposto que torna possível o próprio desenvolvimento das ciências particulares. De outro lado, mesmo que a leitura do texto ainda esteja em andamento, é possível antever que a Metafísica com a qual trabalha o autor diverge em seu conteúdo teológico daquela que venho desenvolvendo, pelo que é possível falar em uma Teologia antecedente que leva ao desenvolvimento de uma Metafísica que, por sua vez, é pressuposta na pesquisa científica.

Casanova inicia seu primeiro capítulo afirmando que para Aristóteles e Platão “epistéme é uma atividade teórica, contemplativa, em que uma afirmação é sustentada por fundar-se em princípios ou causas” (Carlos A. Casanova. Física e Realidade: reflexões metafísicas sobre a ciência natural. Trad. Raphael D. M. De Paola. Campinas, SP: VIDE Editoral, 2013, p. 17). O que significa um conhecimento decorrente de premissas que estejam relacionadas com a causa real daquilo que está na conclusão de um juízo, saber esse que pode estar ordenado em uma disciplina. “Mas nunca devemos perder de vista que, diferentemente de Karl Popper, Thomas Kuhn ou Alasdair MacIntyre, Platão e Aristóteles não entendiam ‘ciência’ num sentido primordialmente sistemático”, porque mesmo enquadrando seus conhecimentos numa visão unitária do mundo, em tarefa aberta ao real e, pois, assistemática, “a abertura às últimas causas – ao ser não unívoco, e ao divino, do qual não podemos alcançar nem intelecções nem demonstrações propriamente ditas – excluía qualquer espelhismo de sistema fechado” (Idem, p. 18).

Reconheço que não tenho conhecimento suficiente das obras de Platão e Aristóteles para contrariar a afirmação anterior, mas, pelo que sei, concluo que também para eles a Ciência era primordialmente sistemática, a despeito de tal sistema, de fato, não ser fechado, não ter limites demasiadamente rígidos.

Entendo, de outro lado, que Casanova, como a maioria absoluta dos cristãos que trabalham seriamente com conceitos filosóficos, não percebe que a visão unitária do mundo dos gregos, sistemática ou não, começou a ser perdida quando uma determinada posição teológica do Cristianismo se firmou na junção do pensamento greco-romano com o judaico-cristão, inicialmente pelo trinitarismo de Niceia; depois ganhando contornos teológicos e filosóficos com Agostinho, na sua proposta de duas cidades, em sua interpretação amilenarista do Apocalipse, com reflexos sobre o sentido e a posição da humanidade na História e na mentalidade geral de uma comunidade científica em que a Teologia era a Primeira Ciência; culminando no dualismo cartesiano, fruto indireto do trinitarismo e da proposta das duas cidades, que é uma forma de gnosticismo platônico contrária à visão de mundo monoteísta.

Nesse sentido, com a trindade, Jesus foi transferido para uma realidade celestial e transcendental, a despeito de sua dupla natureza (sobre o que remeto o leitor ao artigo “A dupla natureza de Jesus Cristo” – https://holonomia.com/2017/08/16/a-dupla-natureza-de-jesus-cristo/), rompendo com a unidade da humanidade e, de certa forma, desencarnando o Verbo. Com as duas cidades e os dois mundos, a vida humana passou a ser regida teoricamente por dois governos, comprometendo a estabilidade política e social, do que os embates político-religiosos que se sucederam são consequência direta. O dualismo cartesiano abriu caminho ao materialismo que, em sua posição final neodarwinista, excluiu a alma e o espírito da realidade.

De fato, por este seu intento de fundar uma ‘matemática universal’, Descartes lutou denodadamente para eliminar da natureza toda forma, qualidade ou fim, convertendo-a em pura res extensa. Por isso, podemos considerá-lo o pai do mecanicismo ou do racionalismo” (Carlos A. Casanova. Obra citada, p. 33).

Casanova, todavia, acertadamente, rejeita a ideia segundo a qual a matemática seria a primeira das ciências, aludindo à Metafísica de Aristóteles para aduzir que a matemática supõe axiomas primeiros, que não são por ela estudados, declarando que a física é subordinada à matemática que, por sua vez, é subordinada à metafísica, porque é esta última que tem como objeto o princípio de não-contradição, pressuposto tanto pela física como pela matemática, das quais não é alvo de estudo.

Ora, uma disciplina que supõe o axioma fundamental, que não o considera, não pode ser tida como a primeira de todas. Mas é óbvio que a disciplina que em sua etapa ‘demonstrativa’ (não somente ‘inventiva’) considera o princípio de não-contradição é a metafísica. Somente ela, portanto, possui o título para reclamar a primazia entre as ciências” (Idem, p. 53 – negrito meu).

Assim, como afirmado acima, uma Teologia mais ampla é pressuposto da Filosofia Primeira, ou Metafísica, enquanto Teologia articulada, que condiciona as ciências particulares. A Teologia, pois, está no topo da hierarquia das ciências, seja enquanto Metafísica sistemática, ou como Primeira Verdade, vinculada ao primeiro postulado, adotado como valor fundante de uma posição perante o mundo da vida e sua relação com a realidade, ou como religião existencial. A Teologia Monoteísta, destarte, prevendo uma ordem de mundo, é indispensável para o desenvolvimento científico.

Casanova sustenta que os cientistas pressupõem que haja uma inteligibilidade no mundo, como conhecimento pré-científico:

Assegurado este âmbito pré e supra-científico com nossa chamada ao pressuposto da inteligibilidade do mundo expressada no princípio da não-contradição, podemos acrescentar que ao menos uma parte dos conhecimentos que precedem às convenções científicas básicas pertencem a esta mesma região metafísica da alma humana. Existe todo um mundo de experiências que constitui o todo contextual, sem o que não poderíamos construir os discursos científicos particulares e analíticos. Parece-me que a máxima aristotélica antes transcrita trata de orientar-nos nesta direção: ‘Toda doutrina e toda disciplina procedem de um conhecimento prévio’” (Idem, p. 84).

Vale citar que parte desse âmbito pré e supra-científico que pressupõe a inteligibilidade do mundo decorre, no ocidente, da tradição judaico-cristã, segundo a qual há uma Sabedoria, uma Razão, o Logos, subjacente a tudo o que existe, acessível à mente humana, em maior ou menor nível. Essa visão é um valor que orientou a vida ocidental por séculos, permitiu o desenvolvimento das ciências naturais e, no plano jurídico, está na origem histórica e racional dos direitos humanos e da dignidade humana, fato constatado por qualquer pessoa com mínima honestidade intelectual.

Nesse sentido, de que a ciência decorre de uma posição teológica perante o mundo, uma Teologia Cristã trinitarista dominou, e domina, o pensamento ocidental por séculos, perdendo parte de seu poder descritivo sobre a natureza com o pensamento cartesiano e com a revolução científica que foi proporcionada por aquela Teologia, quando uma ideia mecanicista passou a preponderar nas ciências naturais, regendo o estudo da res extensa, das coisas do mundo sensível, de um lado, até que também no plano social, associado à res cogitans, de outro lado, ascenderam os pensamentos sociológicos positivista e marxista, do que são exemplos o Círculo de Viena e a Escola de Frankfurt, assumindo posições equivalentes à que tinha a Teologia durante a chamada idade média.

Diante do esgaçamento dessas propostas, dessas teologias cambetas, é válido o resgate da Metafísica aristotélica, pretendido por Casanova. Entretanto, considero essencial que essa restauração inclua a ressurreição da Teologia Cristã primitiva, antes da imposição dogmática que afastou o pensamento cristão do mundo judaico, para restabelecer como ponto primordial a unidade Monoteísta, em que o Espírito, Deus, está no mundo e em nós, e se manifesta na História humana, que culminará no Reino, ou Era Messiânica, até que venha a evolução material do cosmos.

Por isso, o Cristianismo e a ideia do Reino de Deus devem ser reconcebidos, com o abandono do platonismo que levou ao dogma da trindade e à projeção do Reino para o além, para o mundo das ideias platônicas.

Nada mais distante do realismo de Aristóteles que pensar que a mente seja um espelho do mundo. A crítica mais dura do Estagirita à teoria das ideias de seu mestre residia em que as ‘Ideias’ eram uma projeção de nossas noções mentais sobre o mundo” (Carlos A. Casanova. Obra citada, pp. 128-129).

Daí a leitura Cristã sem a trindade, na refundação da união dos logos grego, conforme a Metafísica aristotélica, com o Logos semítico, porque nós vivemos em ideias, vivemos no Espírito, somos Espírito, ou Ideia, encarnamos o Logos, encerrando no tempo o que está fora do tempo, dando forma à matéria, segundo a Forma Primordial do mundo. O pleno desenvolvimento científico depende da Metafísica, e a perfeição desta é condicionada pela Teologia, pela Ciência Primeira, pela ontologia básica da realidade divina da qual participamos.

Tudo isto para que procurassem a divindade e, mesmo se às apalpadelas, se esforçassem por encontrá-la, embora não esteja longe de cada um de nós. Pois nele vivemos, nos movemos e existimos, como alguns dos vossos, aliás, já disseram: ‘Porque somos também de sua raça’. Ora, se nós somos de raça divina, não podemos pensar que a divindade seja semelhante ao ouro, à prata, ou à pedra, a uma escultura da arte e engenho humanos” (At 17, 27-29).

Por elas nos foram dadas as preciosas e grandíssimas promessas, a fim de que assim vos tornásseis participantes da natureza divina, depois de vos libertardes da corrupção que prevalece no mundo como resultado da concupiscência” (2Pe 1, 4).