Idoneidade moral

A inspiração para este artigo surgiu durante a preparação de uma palestra para o “Primeiro Encontro de Comissários e Conselheiros Tutelares da Comarca de Ubá – MG e região”, vindo o estalo depois da meditação sobre um dos requisitos necessários para a candidatura a membro do Conselho Tutelar, ou seja, a idoneidade moral, conceito jurídico que remete às ideias morais.

Idoneidade moral é um conceito usado em muitas normas, para designar uma qualidade necessária do pretendente a uma atividade pública, sendo um requisito pessoal para a ocupação de um cargo público ou para o exercício de função pública.

Idoneidade tem origem no termo latino “idoneitate”, que expressa a qualidade de idôneo, tendo também o significado de aptidão, capacidade, competência e habilitação. Idôneo decorre “do Latim de IDONEUS, ‘em bom estado, conveniente, útil’” (http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/idoneo/).

Moral também vem do latim “Latim moralIS, ‘comportamento adequado de uma pessoa em sociedade’, literalmente ‘relativo às maneiras, ao comportamento”, de MOS, ‘costumes, maneiras, modo de agir’” (http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/moral/).

Segundo a Constituição Federal a idoneidade moral é necessária para naturalização do estrangeiro e para ser membro do Tribunal de Contas da União, do Tribunal Superior Eleitoral e do Tribunal Regional Eleitoral.

O conceito de idoneidade moral se liga ao de reputação ilibada, qualidade exigida para compor o Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça, o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior do Trabalho, para ser Advogado-Geral da União ou membro do Tribunal de Contas da União, de Tribunal Regional Federal ou de Tribunal de Justiça.

Apesar dessa semelhança, pode-se entender que reputação ilibada é uma qualidade mais restrita que idoneidade moral, uma vez que “’ilibado’ vem do Latim ILLIBATUS, “’limpo, que não foi tocado’. Forma-se por IN- mais LIBARE, ‘derramar uma parte do vinho consagrado após tê-lo provado ligeiramente’. Portanto, o que é ilibado é visto como ‘inteiro, não tocado, incorrupto, imaculado’” (http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/ilibado/). Já reputação “veio do Latim reputatio, ‘consideração’, de reputare, ‘refletir sobre, estimar, calcular’, de re-, ‘de novo’, mais putare, ‘pensar, supor, calcular’, originalmente ‘podar’” (http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/reputacao/).

Idoneidade moral está ligada à boa reputação, à boa imagem pública da pessoa, segundo uma visão de mundo, segundo uma ideia de ordem social, que estipula os comportamentos socialmente adequados.

Já a reputação ilibada se refere à melhor reputação possível, à maior integridade possível, à maior santidade, como qualidade do que é santo ou são, saudável, socialmente saudável, ou que estiver mais próximo da perfeição moral, por ser imaculado ou incorrupto.

Portanto, tanto idoneidade moral quanto reputação ilibada são conceitos relativos e vinculados a uma determinada visão moral de mundo, a uma cosmovisão, a uma filosofia, como sistema racional de ideias.

Desde sempre houve duas grandes propostas filosóficas para explicar a realidade: o materialismo e o idealismo ou espiritualismo; cada uma com suas respectivas visões morais de mundo.

Nesse sentido, idoneidade moral é o comprometimento com o padrão moral de referência, com o regramento da conduta da pessoa segundo essa visão de mundo. As condutas são regradas por qualidades chamadas virtudes ou vícios, e quanto maior a virtude maior a dignidade da ação e da pessoa, e quanto menor a virtude, ou quanto maior o vício, menor a dignidade do comportamento e da condição da pessoa.

O cristianismo é uma visão de mundo espiritualista, que prega a paz, a humildade, a solidariedade, a pureza espiritual, a unidade da humanidade e a racionalidade coletiva, sendo contra a violência, sustentando a existência de um plano de realidade espiritual ligado ao mundo físico, e por isso o objetivo final da conduta das pessoas é a salvação da alma, individual e coletivamente, para a vida eterna.

A história do ocidente se atrela ao conflito entre as citadas filosofias, relativamente oculto até a idade moderna e explícito na idade contemporânea, quando o materialismo, especialmente a partir de Marx, Nietzsche e Freud, passou a atacar abertamente o idealismo e o cristianismo, que assumiu a visão idealista do platonismo.

A origem do materialismo pode ser ligada ao atomismo, que entendia que o mundo era formado de partículas indivisíveis, das quais todas as demais coisas eram feitas, inclusive as pessoas. O materialismo se liga a um individualismo, à separabilidade ontológica das coisas, dos fenômenos e das pessoas.

Para o idealismo, a realidade não se limita aos corpos, sendo também espiritual. Atualmente, pela física moderna idealista, a matéria é a quantização de um campo energético, os corpos são unidades relativas decorrentes de campos transcendentes aos limites aparentes dos corpos, os corpos são interações de campos quânticos.

O materialismo se restringe aos limites sensíveis dos fenômenos, enquanto o idealismo alcança uma realidade invisível e mais ampla que os simples aspectos locais dos fenômenos.

Existe, assim, uma moral radicada, fundada, no átomo, no materialismo e nas sensações exteriores, que é o radicalismo materialista; e a fundada na ideia e na inteligência, no espiritualismo, o radicalismo racionalista, ou espiritualista.

Para o materialista tudo tem origem na matéria e termina na matéria, e por isso o corpo é um fim em si mesmo. De outro lado, o espiritualismo entende que o Espírito é a origem de todas as coisas, sendo o corpo um momento da vida das pessoas, sendo o Espírito mais que o corpo, pelo que o corpo não é um fim em si mesmo, estando ligado aos demais corpos, numa realidade espiritual transcendente aos corpos individuais.

Todos os conceitos de uma determinada filosofia, seja materialista ou idealista ou espiritualista, são conectados entre si, uma vez que um sistema filosófico, por natureza, deve ser coerente em seus próprios termos, pelo que as ideias são encadeadas lógica e racionalmente, sem contradição interna entre os referidos conceitos, mantendo-se a unidade do sistema.

Nesse ponto, falar em idoneidade moral exige relação do referido conceito com o sistema moral de referência, o sistema moral de base que funda a interpretação do que seja idoneidade moral, ou reputação ilibada.

Historicamente, uma determinada visão Cristã de mundo, com sua moralidade geral, dominou o ocidente desde o fim da idade antiga, transformando e fragmentando o império romano, que foi sucedido pelo império de Carlos Magno e depois pelos reinos nacionais, na Inglaterra, Portugal, Holanda, Espanha e França, por exemplo, cada um deles pretendendo, a seu modo, a sucessão do império romano. Mesmo a Alemanha nazista e os Estados Unidos se declara(ra)m cristãos.

Mas dentro da chamada cristandade, duas vertentes se abriram com a reforma protestante, o catolicismo romano, de um lado, e o luteranismo, o calvinismo e o anglicanismo, de outro, com divergências em suas moralidades. Enquanto o lado católico romano, com sua hierarquia, pecava pela falta de autêntica liderança cristã seguindo o exemplo santo do martírio de Jesus Cristo, o lado protestante, com seu liberalismo individualista, permitiu que aflorasse no mundo uma noção política voltada quase exclusivamente para o interesse econômico, o mercantilismo que desembocou no capitalismo selvagem de hoje.

Portanto, o mundo presencia um descomprometimento generalizado com a moral Cristã pelo mundo cristão e, ao mesmo tempo, um ataque à mesma moral pelo mundo anticristão, o mundo materialista ateu.

Os tempos atuais, destarte, são aqueles em que a moral Cristã é atacada tanto pelo materialismo quanto pelo falso cristianismo.

Contudo, o próprio cristianismo se liga à ideia de materialização, pois se baseia na encarnação do Espírito Santo de Deus em Jesus Cristo, quando o Logos se fez carne e habitou entre nós, o que confere importância à vida material das pessoas. Esse Logos é a própria Filosofia Cristã, a Sabedoria, de origem judaica, que se consumou em Jesus Cristo, e que orienta a melhor conduta humana, pois o próprio conceito de humanidade está umbilicalmente ligado ao Mestre, Jesus Cristo. Para o cristianismo, todos somos templos do Espírito Santo, compartilhando o mesmo Espírito, e por isso todos podemos encarnar o Espírito de Deus, torná-lo visível.

E essa a moral Cristã somente recentemente foi sistematizada, ganhando especial formulação com o imperativo categórico de Kant. Nesse ponto, a moral Cristã, como ciência do Todo humano, e do holomovimento, ainda em está em desenvolvimento.

Portanto, o grande problema da moral Cristã está no fato de nunca ter sido praticada no âmbito público, no âmbito político, para o qual também foi formulada. A moral Cristã é uma moral para a vida privada e para a vida pública, sendo Jesus Cristo o Messias Judeu, o Rei dos Reis, o Líder Político da Ekklesia iluminada, da Igreja de Cristo, do Estado fundado no Logos, em princípios racionais, fundado na Unidade Espiritual da Humanidade, na dignidade humana.

O imperador Constantino não praticou a moral Cristã, o mesmo podendo ser afirmado sobre quase todos os reis, antigamente, e políticos, atualmente, que se dizem cristãos.

O mundo vive, é bom que se diga, no tempo do anticristo, no tempo em que o Cristão, o que pretende viver submisso ao Logos, pretende viver islamicamente conforme a razão, é atacado pela ignorância mundana irracional, que governa a massa amorfa de indivíduos que delegam a razão de seu comportamento individual à opinião pública midiática controlada pela esquerda marxista materialista e coletivamente irracional, ou que apenas agem de forma egoísta por amor ao dinheiro, isto é, as pessoas não pensam as questões morais de forma fundamentada, apenas de modo superficial, o que é o interesse do materialismo, cujos fundamentos teóricos foram solapados pela física moderna, a qual afastou a separação dos pensamentos e dos fenômenos, pelo que seus argumentos (do materialismo) não conseguem passar da superfície da racionalidade, sendo meramente circular, e ideológico, no sentido negativo da palavra.

Moral também se liga ao conceito de vergonha, de embaraço psicológico decorrente da ilicitude praticada. Quando a ilicitude é praticada sem vergonha, a moral se alterou.

Nesse ponto, “orgulho LGBT” é contrário à moral Cristã, assim como a defesa do aborto, da guerra ou da pena de morte. Declarar-se favorável à prática contrária a uma moral é declarar-se contrário àquela moral, e quando a pessoa adota condutas contrárias à referida moral, ocultamente, e não as declara, por vergonha, ela ainda aceita a ordem moral que contraria, o que talvez seja menos pior do que a postura abertamente contrária à referida ordem comportamental, porque aquela vergonha ainda representa um resquício da moral contrariada, um vínculo com a realidade, que ainda poderá levar ao arrependimento, à correção na visão de mundo da pessoa. Assim, há os que negam a realidade da moral e os que negam que violam a moral, sendo que estes ainda a reconhecem e se envergonham por contrariá-la.

O cristianismo é uma moral de Vida, contra a morte, e contra o suicídio, tanto corporal como espiritual, considerando que a falha moral, o pecado, no fim das contas, leva à morte: “Porque o salário do pecado é a morte, e a graça de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 6, 23). A incoerência é um suicídio intelectual, um suicídio racional, um suicídio filosófico, e a violência à razão leva à violência física e à morte. A irracionalidade individual pode acarretar a irracionalidade coletiva, que leva à morte. A conduta moralmente inadequada, como o pecado, ou conforme uma moral equivocada, contraria a razão coletiva, isto é, afronta a unidade orgânica da comunidade, sendo uma forma de suicídio intelectual, tendo como efeito natural a reação do organismo coletivo para se defender daquele membro nocivo, em resposta imunológica, com sua exclusão, com sua morte social, ainda que inconscientemente.

O Brasil foi formado em uma cultura cristã, ainda que em uma visão falha do cristianismo, como praticamente todas as visões praticadas pelas instituições religiosas tidas como cristãs, e ainda assim a influência do cristianismo no ordenamento jurídico é evidente e positiva, desde a promulgação da Constituição sob a proteção de Deus, passando pela dignidade humana como fundamento da República e pela solidariedade e a fraternidade como valores estruturantes do Estado, orientado para a paz.

Finalmente, com base nesses valores, e tendo em vista que as ações humanas são ideias em movimento, mais cedo ou mais tarde todos terão que entender que existe uma hierarquia moral, com condutas mais santas, ilibadas e idôneas, segundo a melhor moral, a mais perfeita visão de mundo, segundo a melhor ideia, o melhor espírito, a ciência racionalmente mais coerente, compreendendo que essas condutas repercutem favorecendo a vida individual e coletiva e que essa melhor moral é o cristianismo autêntico, baseado na ideia santa, no Espírito Santo, na Razão, no Logos, bem como será necessário reconhecer que negar esse fato será negar a Verdade, o que é uma forma de suicídio, é um suicídio intelectual ou espiritual.

A moral Cristã é baseada no sacrifício de Jesus Cristo, no regramento da conduta individual pelo bem coletivo, e esse sacrifício, tanto do Mestre como dos apóstolos e outros mártires, o que é diferente de suicídio, foi e é condição sine qua non para a formação da civilização ocidental e para a vida livre dos tempos atuais, para a Liberdade, que a moral materialista tenta transformar em libertinagem, segundo uma visão moral torta, e irracional.

Por isso, idoneidade moral e reputação ilibada, na ordem jurídica brasileira, em uma interpretação ontológica e histórica dos fenômenos, na hermenêutica adequada, sem a deturpação ideológica produzida recentemente pelo materialismo ateu e pelo falso cristianismo, remetem à moral Cristã autêntica, com todos os conceitos dela decorrentes, como a natureza jurídica e política do cristianismo, fomentando a ação pública das pessoas no Estado, na comunidade politicamente organizada, especialmente para promoção da vida e da família, com fundamento na solidariedade, no serviço público e, especialmente, com a preocupação da salvação da alma e do Espírito, para a Vida eterna.

Violência e Verdade

O mundo atual sofre por causa da violência, tanto física como moral e intelectual. A primeira é mais perceptível que as outras, mas provavelmente é efeito da generalização da violência intelectual e da violência moral. O mundo atual é irracional, e por isso violento.

A violência intelectual é aquela praticada contra a inteligência, contra a razão, contra a Verdade; é a primeira violência, que causa as demais. E a primeira violência contra a Verdade é negar a sua existência, relativizando o conceito de Verdade, como ocorre na proposta de Nietzsche, dizendo não haver fatos, apenas interpretações. Não é por acaso que Nietzsche morreu louco em um hospício, depois de perder todo contato com a realidade.

Nesse ponto, é importante ressaltar que a Verdade é a Realidade, e a Razão, a Verdade é Real, e Racional, e negar a existência da Verdade é negar a própria Realidade, é negar a Razão, o Logos. Sobre este conceito, remeto o leitor ao artigo “A Realidade” (https://holonomia.com/2017/03/23/a-realidade/).

Assim, apenas a Verdade é Real, e somente a realidade é verdadeira e racional. A Verdade está em todos os ramos da ciência, mas não se limita por nenhum deles. E a especialização científica, nesse aspecto, é um problema para a Verdade, na medida em que o aprofundamento do conhecimento de determinado setor do conhecimento geralmente é acompanhado pelo abandono dos demais ramos científicos, com prejuízo para o conhecimento da Verdade, como totalidade do saber científico. Quem sabe tudo de nada, nada sabe. A mera fragmentação do conhecimento contraria a Verdade, como a análise sem a síntese. O conhecimento de exceções não pode permitir o esquecimento da regra, assim como o entendimento do todo é condicionante para a compreensão de suas partes.

A Verdade é a realidade de todas as ciências. Apenas a Física, a Biologia, a Química e/ou o Direito não contêm toda a Verdade, apesar de esta estar naquelas. A Verdade é, outrossim, o conjunto integral e harmônico das verdades científicas.

O Direito, de sua parte, procura a Verdade, mas, para fins práticos, em alguns casos, para tornar pacífica ou resolvida a questão, contenta-se com a verdade jurídica, também chamada verdade formal, decorrente, por exemplo, das presunções legais e dos efeitos dos ônus probatórios no processo judicial. Nesse sentido, cabe ao autor provar os fatos que alega, para ver seu direito satisfeito; e cabe à acusação a prova da existência do crime e da autoria ou participação pelo réu, para conseguir a condenação. De outro lado, no processo civil, a revelia, a falta de contestação ou de impugnação dos fatos afirmados pelo autor pode levar ao entendimento, por presunção, de que esses fatos são verdadeiros.

Desse modo, as ciências parciais possuem verdades parciais, mas a Verdade transcende as verdades parciais das ciências. A Verdade, portanto, é Global, é Indivisível, é Plena, é Unitária.

Assim, existem fatos, e a Verdade é a interpretação completa dos fatos, conectando-os a todos os demais fatos, por meio da razão, da unidade racional, do Logos.

Jesus Cristo, como manifestação viva do Logos, da Vida, é a Verdade, porque Sua Verdade transcende as verdades dos ramos científicos, mesmo dos atuais, e também por isso suas ações sobre o mundo são conhecidas como milagres, por extrapolarem os limites do conhecimento científico parcial. Além da Física, Ele acalmou o movimento dos ventos, controlou uma tempestade, sem falar no fato de ter andado sobre as águas, desafiando a gravidade. Além da Química, transformou água em vinho. Além da Biologia, realizou e realiza curas e ressurreições, isso deixando de lado Sua própria ressurreição. Além da Sociologia e da Psicologia atuais, moveu a sociedade nos últimos dois mil anos, dividindo a História em duas fases, antes e depois de seu nascimento (ainda que ele tenha nascido por volta do ano 10 antes de Cristo) e tem conhecimento do interior do homem, é o Si-mesmo, a unidade da humanidade.

E o mais importante, no Direito, porque Jesus é o Messias Judeu, o Rei dos Reis, a realização plena da Lei, humana e natural, por ser o cristianismo uma religião jurídica e política, Ele fundou os direitos humanos, o conceito de humanidade, e exerce o julgamento divino como medida da humanidade, sendo o modelo perfeito de governante.

Apenas Jesus Cristo, individualmente, alcançou a Verdade, sendo o Logos em ação. Mas Ele nos deixou o exemplo, o Método científico, enquanto Caminho para chegarmos a Deus, ao Logos, à Verdade, e prometeu acompanhar aqueles que Nele crerem, seguindo-o. O apóstolo Paulo, seguidor de Jesus, disse que a Igreja é a coluna e o alicerce da Verdade.

Todavia, se eu tardar, saberás como proceder na casa de Deus, que é a Igreja do Deus vivo: coluna e sustentáculo da verdade” (1Tm 3, 15).

Como o Direito, especialmente na sua elaboração pública e racional pelo Estado, regula mesmo as atividades dos demais ramos do conhecimento, das demais ciências, o Estado, a Igreja, a Ekklesia, a comunidade fundada em princípios racionais, serve de parâmetro da verdade, pois a função do Estado é servir a coletividade, e a Verdade é coletiva. Quando o Estado se afasta da Verdade, a Verdade se impõe, como ocorreu na revolução francesa, na revolução russa, quando a verdade da minoria privilegiada contrariava a Verdade, quando o Estado não cumpria suas funções, situação enfrentada hoje pelo mundo globalizado.

O Estado contemporâneo, portanto, está se desviando da Verdade, negando a realidade e a natureza das coisas, transformando erros e exceções em supostas regras. Por exemplo, afirmar a existência de “casamento gay” é negar a ontologia do casamento, a Verdade da instituição. E quando a ONU, como superentidade estatal, afirma que homossexualismo é normal e não pode ser tratado, isso levou a edição de normas nesse sentido, de conteúdo ideologicamente sectário, em detrimento da ciência. Mesmo deixando de lado a questão religiosa, se Richard Dawkins, com sua hipótese de gene egoísta, estiver certo, é possível considerar o comportamento homossexual como uma anomalia, genética e/ou psíquica, passível de tratamento, porque contraria a reprodução genética e o desenvolvimento da vida, pelo que a proibição de tratamento contra o homossexualismo, dado que a hipótese de ser patologia não é cientificamente absurda, contraria a Verdade mesmo segundo a ciência materialista mais moderna.

A própria negação da realidade social e assistencial do Estado afronta sua ontologia, sua Verdade, o que também ocorre quando é usado para promover guerra e matar seres humanos, principalmente por motivos econômicos ou ideológicos. A função do Estado é promover a Vida, a humanidade, que é coletiva e independe do local de nascimento da pessoa, é a razão de dois ou mais, para todos os seres humanos.

Em verdade vos digo: tudo quanto ligardes na terra será ligado no céu e tudo quanto desligardes na terra será desligado no céu.

Em verdade ainda vos digo: se dois de vós estiverem de acordo na terra sobre qualquer coisa que queiram pedir, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos céus. Pois onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles” (Mt 18, 18-20).

A Verdade é Espiritual, é coletiva, objetiva e racional, sendo compartilhada, e daí porque a reunião das pessoas em nome de Jesus Cristo, em nome do Logos, para a unidade da humanidade, pode atingir a Verdade que alcança o Espírito, que é eterno.

A Verdade se liga à santidade, à sanidade, à integralidade da Vida. E a Palavra de Deus, em sua plenitude, o Logos, é a Verdade.

Santifica-os na verdade; a tua palavra é verdade. Como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. E, por eles, a mim mesmo me santifico, para que sejam santificados na verdade” (Jo 17, 17-19). A comprovação de que a palavra de Deus, inclusive, e especialmente, a encontrada da Bíblia, é Verdade está no fato de que as profecias estão em pleno cumprimento, as predições estão acontecendo.

Portanto, negar o Logos, negar a Razão, a Verdade e a Realidade, é a primeira violência praticada pela pessoa, por egoísmo, medo ou ignorância. E essa violência intelectual, possuindo limitação racional, impede o desenvolvimento do diálogo, da comunicação, levando à violência moral. Quando a pessoa perde o argumento, perde a razão, e já tendo violentado a Verdade, parte para a violência moral, para as ofensas verbais, e estas, acumulando-se, levam à violência física.

Tanto a violência moral quanto a violência física podem ser decorrentes de falta de paciência, diante da grande diversidade de níveis argumentativos, quando não há boa vontade para o desenvolvimento da comunicação, como podem surgir da não aceitação do erro, do apego ao egoísmo, quando a razão é deixada de lado, passando a ser adotada a força bruta.

A Verdade liberta da ignorância, sendo pacífica e paciente, seguindo o exemplo do Mestre, que morreu pacificamente na cruz, o que foi, ao mesmo tempo, uma violência brutal.

Se permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (Jo 8, 31-32). A Verdade, sendo Espiritual, permitiu que os mártires se libertassem do apego corporal, entregando a Vida pela Verdade, segundo a qual este corpo é provisório.

A Lei e os Profetas até João! Daí em diante, é anunciada a Boa Nova do Reino de Deus, e todos se esforçam para entrar nele, com violência” (Lc 16, 16).

A violência que o Cristão pratica é a violência da resistência firme contra a mentira, é a violência da sabedoria, da luz, que faz cessar as trevas com seu brilho, ofuscando a ignorância. Jesus disse a seus seguidores:

Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte. Nem se acende uma lâmpada e se coloca debaixo do alqueire, mas no candelabro, e assim ela brilha para todos os que estão na casa. Brilhe do mesmo modo a vossa luz diante dos homens, para que, vendo as vossas boas obras, eles glorifiquem vosso Pai que está nos céus” (Mt 5, 14-16).

Em tempos de escuridão, a luz é violenta, é uma agressão aos olhos acostumados às trevas e à ignorância, como nos filmes apocalípticos, em que os zumbis não podem andar durante o dia.

Outrossim, a violência praticada pelo Cristão é a violência da Verdade, contra a mentira dominante, a violência de ser agredido injusta e pacificamente, como a revolução liderada por Gandhi, com a técnica da Satyagraha, da força da verdade, estando com a razão, com o Logos, ser achincalhado, chamado de ignorante e medieval, quando, em verdade, a sabedoria de Deus, do Logos, a Verdade, é loucura para os homens, é uma violência…

Transcendência imanente

A transcendência é a qualidade de alguma coisa ou alguém que está além de uma referência. Tudo que transcende, transcende algo, pelo que esse algo é imanente àquilo que o transcende, até mesmo para permitir a identificação e qualificação da própria transcendência, a qual é relativa àquilo por ela transcendido. Assim, o conceito de transcendência está ligado ao de imanência, e ambos se situam no âmbito filosófico ou metafísico, e teológico, como a questão da transcendência e/ou imanência de Deus em relação ao mundo.

Nesse sentido, podemos entender a metafísica como o estudo da transcendência imanente das coisas e fenômenos, da sua conexão funcional e lógica com o Todo, que é imanente e transcendente às partes que O compõem, e com o Logos.

Toda imanência, pois, é transcendente, como já indicava Platão e seu mundo das ideias, mas não se pode considerar a realidade apenas como transcendente, mas como transcendência imanente. Nessa linha, no âmbito da linguagem, o enunciado procura a transcendência da quaestio mais imanente à coisa, mostrando o ser da coisa em símbolo, que transcende a coisa, a ela se ligando.

No âmbito Cristão, Santo Agostinho, com suas duas cidades, separou a imanência da transcendência, afastou o Criador da criatura no âmbito político, o que implicou na negação da realização imanente do Reino de Deus, contrariando a essência política e histórica do Evangelho. Hoje vivemos o efeito dessa separação, a Besta, como cidade dos homens em que está vetada ideologicamente a correta hermenêutica da realidade estatal como entidade religiosa, adotando ignorantemente a concepção laica, leiga ou acientífica e amoral do Estado.

Toda metafísica se liga a uma causa primeira, a um pressuposto racional. Sabendo ou não, as pessoas sempre estão adorando um deus, uma causa primeira. O deus moderno é a independência, a separação, a redução, o reducionismo, a autonomia das pessoas, num materialismo caótico.

O ponto de partida, o primeiro princípio, a causa primeira, pode ser “eu” ou “o outro”, que leva a um início ativo ou passivo da compreensão de mundo. O materialismo do “eu” tenta dominar o mundo a partir da separação ativa da pessoa em relação aos demais, tornando o mundo imanente ao “eu”. Deus, como princípio “outro”, por sua vez, permite que o primeiro princípio também seja “eu”, desde que no Logos, caso em que “eu” e “o outro” somos um, como ensina Jesus Cristo. O Criador permite a criação da/pela criatura pelo Logos.

Pela metafísica Cristã, a pessoa se aceita como criada por Deus, sendo grata por isso, daí o primeiro mandamento: “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento”. Assim, o Cristão renuncia à sua autonomia, reconhecendo a autoridade do Deus transcendente e imanente, conhecendo-o, entendendo-o. A partir daí, respeitado Logos, poderá agir sobre o mundo, que é imanente a Deus, desde que obedecido o segundo mandamento: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. A onipresença de Deus O torna imanente ao mundo e a nós, como templos de Seu Espírito, que tudo transcende, pois Deus está em tudo, mas por nada é limitado.

O pressuposto racional normalmente é oculto no âmbito científico, como ocorre com o reducionismo e a separabilidade (pressuposta e falsa) dos fenômenos. Para o aprofundamento dos estudos científicos, os pressupostos são simplesmente aceitos, e o problema da ciência atual é seu pressuposto equivocado da separabilidade das coisas, que leva à fragmentação do conhecimento e à perda de sentido cósmico. Como entende David Bohm, a visão fragmentada do mundo leva a uma tendência à divisão e exclusão, inclusive social, o que fica evidente pela análise do noticiário.

A ciência, e todo conhecimento, é transcendente, pois conhecedor e conhecido estão um além do outro e ainda assim formam uma unidade. Portanto, a visão reducionista de mundo se torna anticientífica, porque perde o contexto da realidade, perde a unidade dos fenômenos, afasta-se do Logos e do verdadeiro conhecimento.

Essa é a ideia da pregação evangélica: “para que sejam confortados os seus corações, unidos no amor, e para que eles cheguem à riqueza da plenitude do entendimento e à compreensão do mistério de Deus, no qual se acham escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento!” (Cl 2, 2-3). Cristo, como Espírito Santo que habita no homem, é a Unidade, é Espiritual, é transcendente, ainda que imanente, unindo os fenômenos, aparentemente isolados, em um mesmo Logos. É preciso deixar a partícula, o egoísmo, e aceitar a onda e sua “incerteza”, reconhecer o controle do mundo por Deus, pelo Logos, pela Providência, pois sem esta nem mesmo haveria universo.

Tomai cuidado para que ninguém vos escravize por vãs e enganosas especulações da ‘filosofia’, segundo a tradição dos homens, segundo os elementos do mundo, e não segundo Cristo” (Cl 2, 8). Isso fica bem claro pelo materialismo do mundo, e pelo reducionismo da atual concepção científica, que não entende matéria, e não compreende o mundo, iludindo até os próprios cientistas. A ciência contemporânea se baseia em filosofia vã e enganosa.

Pois nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade e nele fostes levados à plenitude. Ele é a Cabeça de todo Principado e de toda Autoridade” (Cl 2, 9-10). Em Jesus Cristo, o Espírito de Deus, da Plenitude, manifestou-se aos homens, em suas ações corporais, mostrando a autoridade divina, em sua transcendência imanente, que está além da pessoa de Jesus Cristo, mas que se tornou presente em sua vida e, especialmente, em sua ressurreição, sendo esta uma prova definitiva da realidade transcendente do Espírito.

Nele fostes circuncidados, por uma circuncisão não feita por mão de homem, mas pelo desvestimento da vossa natureza carnal: essa é a circuncisão de Cristo” (Cl 2, 11). Para se alcançar a plenitude da vida é preciso o despojamento corporal, ou seja, viver no corpo não apenas para o corpo, mas segundo o Espírito, o Logos, que é coletivo e solidário.

Este artigo teve sua inspiração em um texto que abordou negativamente a metafísica clássica, negando a ideia ontoteológica, sobre uma discussão acerca da natureza de Deus (http://www.conjur.com.br/2017-set-09/diario-classe-mesmo-lei-seja-clara-sempre-cabeum-enunciado-bingo). E por mais que eu reconheça a boa-fé dos autores do texto, percebo que a boa-fé não é suficiente, existindo aquele ditado: “de boas intenções o inferno está cheio”. A boa intenção, a boa-fé, de outro lado, pode até permitir a salvação individual, o que penso ocorrerá com os citados articulistas. Mas o que salva a coletividade é a boa fé, a boa ciência, a boa religião, que leva à Verdade objetiva, ao Logos, que é o Cristianismo de Jesus Cristo, o Messias judeu, com sua ação política e jurídica, na comunidade pública, e não o que se entende como cristianismo pela cristandade.

Portanto, ao contrário do que constou no citado artigo, a ontoteologia é sempre presente, ainda que a fusão ontoteológica da Grécia com o Cristianismo esteja errada, a partir dos dogmas do quarto século e da teologia agostiniana.

Espinosa também não está com a razão, pois ainda que Deus esteja na natureza, o imanente não contém o transcendente, mas está contido neste, uma vez que é o transcendente que contém o imanente. Portanto, o reducionismo científico está equivocado, como não estão corretos o transcendentalismo de Agostinho e o panteísmo imanentista de Espinosa.

Assim, o erro metafísico é geral e pressuposto, anteposto, e daí a dificuldade de percebê-lo.

Como nos ensinou Jesus Cristo, o mensageiro altera e influi na mensagem. A mensagem religiosa, filosófica, deve ser não apenas transmitida, como também vivida, seguindo o exemplo do Mestre, o Caminho, que mostra a Verdade e revela a Vida, por sua vida.

E o Cristianismo, como religião jurídica, nesse sentido, exige a prática da Lei, demanda a obediência ao Logos.

O direito como forma, como norma amoral, exclui seu conteúdo e perde seu contexto, e Direito é conteúdo. A forma é um instrumento para tornar inteligível o conteúdo da Justiça. Direito é Justiça e Razão, é Logos, racionalidade coletiva, imanente e transcendente, é prática de vida, e modelo de vida, conforme os bons exemplos cristãos, que servem de precedentes, para o melhor que humanidade já viu e pode ver, inclusive em matéria de ideias políticas e jurídicas.

Juridicamente, o precedente é transcendente, como a jurisprudência que transcende o caso, servindo de precedente para outros julgamentos.

Julgar é medir, e medir é usar uma régua, um parâmetro, uma razão, transcendente ao que é julgado. A medida de Jesus é transcendente e imanente no comportamento do Cristão, como Espírito que observa e altera a realidade.

O observador é transcendente, mas a observação é imanente. Como concluiu a física moderna, observar é interagir.

Assim, a ação e o julgamento transformam a norma transcendente em norma imanente, por meio do julgador, quando este, observando a causa, no ato do julgamento, que se inicia no primeiro contato com a demanda, e continua durante toda a atividade do observador com a quaestio iuris, conduzindo a imanência do processo pela transcendência do Logos, que antecede a análise da causa, pelo mundo da vida jurídico, incluindo a Constituição e as leis, torna-se presente no seu julgamento, pela sentença, e que permanece vinculando a questão durante a vida dos envolvidos.

Jesus Cristo, como medida da humanidade, e, portanto, como nosso julgador, presente em nós como Logos que, do mesmo modo, nos transcende, e nos antecede, acompanha nosso desenvolvimento pessoal enquanto humanos e seres racionais, e permanece além de nossas vidas, como Logos, em sua transcendência imanente.

Jesus: Deus Salva

O nome Jesus significa Deus Salva, e essa é uma das mensagens ensinadas por Jesus Cristo. Ele fez sua parte, cumpriu suas obrigações como Messias e Deus O Salvou, ressuscitando-o antecipadamente.

O mesmo vale para nós, pois Deus é fiel. Nós fazemos a nossa parte e Deus faz a Dele. Como existe uma unidade entre nós e mundo, a forma como agimos sobre o mundo implica em reação do mundo sobre nós, mas existe um retardo nessa reação, que não depende de nós, mas de Deus, o Único que sabe quando ressuscitaremos. O tempo de reação é de Deus. “Não digas: vingar-me-ei do mal; espera por Iahweh e ele te salvará” (Pr 20, 22).

Deus prometeu sucesso àqueles que cumprem Seus mandamentos.

Guardarás as ordens de Iahweh teu Deus, andando em seus caminhos, observando seus estatutos, seus mandamentos, suas normas e seus testemunhos conforme estão escritos na lei de Moisés, a fim de seres bem sucedido em tudo quanto empreenderes e em todos os teus projetos. Para que Iahweh cumpra a promessa que me fez, dizendo: ‘Se os teus filhos conservarem boa conduta, caminhando com lealdade diante de mim, de todo o seu coração e de toda a sua alma, jamais te faltará alguém no trono de Israel’” (1Rs 2, 3-4).

A situação do mundo é caótica porque vivemos o tempo do anticristo, em que os mandamentos são simplesmente ignorados, além de violados. O mundo está caótico porque somos desordeiros, como espécie.

Isso decorre do fato de que não somos ilhas, não estamos isolados no mundo, mas estamos no mundo, que é governado por Deus, pelo Logos. Esse Logos indica uma unidade dos fenômenos, uma relação entre tudo o que existe, além de nossa capacidade material de compreensão.

Modernamente, a física quântica demonstra essa situação nos níveis mais básicos da natureza, pois os processos atômicos “são essencialmente determinados pela interação dos objetos em questão e dos instrumentos de medida necessários à definição dos projetos experimentais” (Niels Bohr. Física atômica e conhecimento humano: ensaios. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto, 1995, p. 32).

Nossos corpos são “instrumentos de medida” que interagem com o mundo à nossa volta, e tanto somos moldados pelo mundo como o moldamos. O tempo atual é reflexo do mundo que moldamos.

Niels Bohr fala do caráter complementar das informações distintas sobre o mesmo objeto, como na hipótese de uma análise corpuscular e uma análise ondulatória dos fenômenos físicos, dizendo que existe uma “relação complementar entre as diferentes experiências sobre o comportamento dos corpúsculos atômicos” (Idem, p. 33). O renomado físico afirma que a interação é uma qualidade básica dos fenômenos atômicos.

A globalidade essencial de um fenômeno quântico propriamente dito encontra sua expressão lógica, com efeito, na circunstância de que qualquer tentativa de subdividi-lo, de maneira bem definida, exigiria uma alteração do arranjo experimental que seria incompatível com o surgimento do próprio fenômeno” (Idem, p. 92).

Essa globalidade dos processos atômicos “impede a distinção entre a observação dos fenômenos e o comportamento independente dos objetos, característica da concepção mecanicista da natureza”, sendo que na escala dos objetos usuais as ações “são grandes o bastante para permitir que se despreze a interação dos objetos e dos corpos usados como instrumentos de medida” (Idem, p. 124). Além disso, “a noção de complementaridade refere-se diretamente à nossa posição de observadores, num campo da experiência em que a aplicação inambígua dos conceitos usados na descrição dos fenômenos depende essencialmente das condições de observação” (Idem, p. 126).

O princípio da complementaridade tem relação com o princípio da incerteza, pelo qual se entende que a forma de observação leva à modificação do que é observado, ou seja, o simples fato de estarmos no mundo altera o mundo em si. O modo pelo qual observamos o mundo, o arranjo experimental que usamos, condiciona o mundo que vemos. Portanto, devemos estar bem no mundo, ver o mundo com bondade e agir com bondade, para mudar o mundo para melhor.

Além disso, o princípio da incerteza também significa que eu não estou no controle do mundo, e sim Deus está, eu não tenho controle, mas Deus o tem. Existe uma ordem no mundo que foge ao meu controle. Eu não posso me salvar, mas Deus pode.

Isso, a existência de ordem apesar da incerteza material, é uma prova de que Deus é amor, que é união espiritual, é Espírito, a unidade do Logos, imanente e transcendente à natureza, pois além das aparências existe uma ordem maravilhosa no universo.

Os céus contam a glória de Deus, e o firmamento proclama a obra de suas mãos” (Sl 19, 2).

A ciência, nesse sentido, é a unidade da razão. A gravidade funciona, mas não sabemos o que é, apenas como funciona, o que também vale para a energia escura e para a matéria escura. O Espírito, do mesmo modo, opera em nós sem que o saibamos, “pois é Deus quem opera em vós o querer e o operar, segundo a sua vontade” (Fl 2, 13). Desse modo, ao procurarmos seguir a Vontade de Deus, é o próprio Deus que opera em nós, pois Ele quer que todos se salvem.

Mas Ele também nos deu a liberdade para agirmos sem seguir Suas Leis, e o mundo atual mostra as consequências desse comportamento.

Assim como existe entropia no universo, em que a desordem aparentemente aumenta, as próprias leis da natureza indicam uma ordem que permanece e aumenta de complexidade, tanto no nível material como no nível biológico, e a própria vida humana é o maior exemplo disso, pois o corpo humano é o organismo mais complexo do universo, e mais complexo ainda é o corpo da humanidade, o Corpo de Cristo, tão complexo que muitos ainda não o entendem, pensando que os indivíduos são separados uns dos outros.

A civilização moderna passa um momento de transe, de mudanças, está doente. Ao mesmo tempo em que Iahweh é o Deus Justo e Alá é o Deus Clemente e Misericordioso, o Estado de Israel não respeita o Direito Internacional e o radicalismo Islâmico mata as pessoas numa “guerra santa” que nem mesmo os muçulmanos entendem. Os que se dizem filhos de Abraão, e mesmo os que se dizem cristãos, matam-se sem perceber que aniquilam seus próprios irmãos.

Essa contradição inerente à vida decorre de nossa liberdade e da ambiguidade existente no universo, que é regido ao mesmo tempo pelo princípio da entropia e pelo aumento da complexidade:

o universo tende à entropia geral, isto é, à desordem máxima e, de outro lado, revelava-se que neste mesmo universo as coisas se organizam, se complexificam e se desenvolvem” (Edgar Morin. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane Lisboa. 4. ed. Porto Alegre: Sulina, 2011, p. 61).

Segundo o paradigma da complexidade “chega-se à visão de um mundo invisível mais real que o mundo real, já que está fundado sobre a ordem, e nosso mundo real tende a se tornar um pouco, como na filosofia hinduísta, o mundo das aparências, de maya, das ilusões, dos epifenômenos” (2011, p. 103) (G. nosso).

A essa conclusão de grande atualidade da ciência, o apóstolo de Cristo, Paulo, já havia chegado há séculos e séculos:

Não olhamos para as coisas que se veem, mas para as que não se veem; pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno” (2Cor 4: 18).

Destarte, mesmo com a entropia e a expansão do universo, sempre existiu uma unidade racional, a coerência da atuação da energia escura, a Lei da Natureza, a vida em evolução, sendo que em Jesus de Nazaré essa coerência foi manifestada e realizada na humanidade, numa Razão que somente agora foi explicada pela física quântica e pela relatividade, a mesma Razão que ocorreu após a criação e fez o desenvolvimento do Universo, o Logos.

Jesus de Nazaré equilibrou sua radiação corporal com a radiação da energia escura, que é a frequência vibratória da onda que vai do Big Bang à eternidade, Ele literalmente entrou na onda do universo [cujo comprimento de onda é um ponto, ou tende para um ponto ou zero – 0, sendo sua frequência infinita ou tendente ao infinito (para fins humanos atuais poderia ser usado o número de 28 bilhões de parsecs – o diâmetro do universo conhecido, o que é praticamente infinito para um homem)], viveu no fluxo da Energia Primordial, que vai do Início ao Fim, o Espírito Santo estava com ele, a mesma energia das superforças que criou o universo. Essa força, assim, tem pressão infinita, pois é a força que expande todo o Universo, para todas as direções, para além do espaço e do tempo. Ele tem o dom da Vida, pois a Energia Primordial, a Luz Divina, é capaz de alterar as cores dos quarks, mudando a “matéria”, mudando o campo de Higgs, pode criar a vida e, consequentemente, o DNA humano. Jesus Cristo atingiu o nível máximo de interação cósmica, pois age conforme a Unidade cósmica, o Logos.

A missão de cada um de nós, como Cristãos, é seguir o Caminho de Jesus, ou seja, alinharmo-nos com Deus, com a Razão, com o Logos, para que Deus nos salve, como salvou a Jesus Cristo. Devemos agir ordeira e solidariamente em relação ao mundo, para recebermos uma resposta ordeira e solidária do mundo.

Cabe a cada um de nós construir a unidade de todos nós, cada um a seu modo, de sua perspectiva única como observador cósmico, mas na Unidade do Espírito, seguindo o Logos. Como na complementaridade, as nossas ciências se complementam em Cristo, o Logos transcendente e imanente, que é o Universal universal.

Iahweh recompensou-me segundo a minha justiça, segundo a pureza das minhas mãos me retribuiu, porque me mantive nos caminhos de Iahweh, sem me distanciar do meu Deus”.

E Iahweh me retribuiu segundo a minha justiça, segundo a pureza que ele viu em mim com os seus olhos. Com o homem fiel tu és fiel, irrepreensível com quem é sem repreensão, puro com quem é puro, tortuoso com o perverso tu salvas o povo dos pobres e abates os olhos presunçosos”.

O caminho de Deus é sem mácula, e a palavra de Iahweh sem impureza. Ele é o escudo de quem nele se refugia” (2Sm 22, 21-22; 25-28; 31).

Deus é Justo, age conosco como agimos com os outros. Mas Deus é melhor que nós, pois está sempre disposto a nos perdoar, se nos arrependermos, pois Ele também é Clemente e Misericordioso.

Daí porque é necessário o arrependimento, como nos foi ensinado: “e a renovar-vos pela transformação espiritual da vossa mente, e revestir-vos do Homem Novo, criado segundo Deus, na justiça e santidade da verdade. Por isso abandonai a mentira e falai a verdade cada um ao seu próximo, porque somos membros uns dos outros” (Ef 4, 23-25).

Como somos membros uns dos outros, tanto física como espiritualmente, devemos contribuir para o crescimento de todos, como Jesus e seus apóstolos nos ensinaram: “Não saia dos vossos lábios nenhuma palavra inconveniente, mas, na hora oportuna, a que for boa para edificação, que comunique graça aos que a ouvirem” (Ef 4, 29).

A unidade física já era proclamada pelo Cristão Paulo “porque somos membros do seu Corpo”, e o mistério se revelou pela ciência. “É grande este mistério: refiro-me à relação entre Cristo e a sua Igreja” (Ef 5, 30; 32). Esse mistério é a unidade quântica, segundo a qual nós interagimos com todo o Universo, pelo mesmo Logos, que forma o Universo e o Corpo de Cristo, que é a Humanidade e o Cosmos, e por mais que essa interação em suas últimas consequências seja desprezada pelos físicos, é inevitável que ela se mostre em algum momento, quando todos descobrirão quem é Jesus e que apenas por Ele, o Observador Universal, por ser a humanidade da Humanidade, Deus Salva.