David Bohm e o erro do atomismo mental

Assistindo ao vídeo “Ned Block – What is the Mind-Body Problem?” (https://www.youtube.com/watch?v=6jvISYC5xvM), atentei-me para um problema fundamental do atomismo mental, que é analisar o problema corpo-mente em termos reducionistas, deixando de lado a realidade segundo a qual a física é entendida, por meio de campos, que vai muito além do mero materialismo atomista, este que compreende as coisas como feitas por blocos individuais, formando unidades maiores independentes. Não que o entrevistado seja propriamente materialista, mas a visão exposta carece de profundidade espiritual.

Associar a consciência e a mente apenas ao cérebro é ignorar a unidade fundamental da realidade, que existe em campos que interagem uns com os outros. As partículas não podem ser interpretadas de forma atomística, isto é, isoladas dos seus respectivos contextos mais amplos.

Não basta compreender o funcionamento do cérebro para entender a mente, pois esta é mais do que aquele. Ainda que, no indivíduo, o processo mental esteja associado ao nível cerebral, até certo ponto, o próprio indivíduo não é algo isolado do mundo, é formado em um contexto tanto físico/biológico como simbólico, e nos dois casos a interpretação atomística é insuficiente para a compreensão da mente.

O cérebro é um órgão do corpo, que possui outros membros, estando inserido em uma comunidade, que vê o mundo de determinada forma, pelo que a mente é dependente não apenas do que está no interior do indivíduo, mas também daquilo que o envolve, na sua interação e participação com o meio, com seu entorno.

É possível pressupor que o próprio desenvolvimento cerebral será distinto a depender da cultura em que estiver inserido e de sua interpretação do mundo, permitindo que determinados conceitos ou ideias sejam percebidos, ativando uns ou outros circuitos cerebrais.

Seguindo a visão de David Bohm, que vê a realidade manifesta como expressão de uma ordem interna, a ordem implicada, segundo a qual cada coisa está internamente relacionada com todas as demais, com a totalidade do universo, pelo que as coisas externas são apenas relativamente independente, conclui-se que tal interdependência também vale para a mente, e assim para pensamentos, sentimentos, desejos e impulsos, os quais fluem dos uns dos outros, e da própria matéria.

“This means that utimaltely mind and matter are at least closely analogous and not nearly so different as they appear on superficial examination. Therefore, it seems reasonable to go further and suggest that the implicate order may serve as a means of expressing consistently the actual relationship between mind and matter, without introducing something like the Cartesian duality between them.” (Isso significa que mente e matéria são, em última análise, intimamente análogas e não tão diferentes quanto parecem em um exame superficial. Portanto, parece razoável ir além e sugerir que a ordem implicada pode servir como um meio de expressar consistentemente a relação real entre mente e matéria, sem introduzir algo como a dualidade cartesiana entre eles – David Bohm. A new theory of the relationship of mind and matter. In Philosophical Psychology, Vol. 3, n.º 2, 1990 – https://casinoqmc.net/local_papers/bohm_mind_matter_1990.pdf).

O autor sustenta que todas as coisas estão sujeitas à dualidade onda-partícula, como explicitado pela física quântica, de modo que a interação entre partículas envolve uma indivisibilidade, uma totalidade específica. Como em larga escala o número de ligações é tão grande, os processos podem ser tratados com algum grau de divisibilidade, mas isso é apenas uma aproximação.

Além disso, destaca que a não localidade é uma propriedade da realidade, e que mesmo em larga escala algumas partículas, ainda que distantes umas das outras, comportam-se como se fossem uma só, como demonstrado pelo teorema de Bell. Essas interações não locais são estranhas ao paradigma newtoniano e mesmo às concepções materialistas de mudo, que entendem as coisas formadas atomisticamente, a partir dos blocos básicos, os átomos, unidos apenas localmente.

“All of this can be summed up in terms of a new notion of quantum wholeness, which implies that the world cannot be analyzed into independently and separately existent parts” (Tudo isso pode ser resumido em termos de uma nova noção de totalidade quântica, o que implica que o mundo não pode ser analisado a partir de partes independentes e separadas – Idem).

Essa é uma clara crítica à visão atomista da realidade, que analisa as coisas do mundo em termos independentes e separados.

Segundo Bohm, o campo quântico pode ser representado como o que chama de potencial quântico, que depende apenas da forma, e não da intensidade do campo quântico. A forma, assim, diz respeito à totalidade presente no campo, que é muito mais do que a soma de suas partes, pois essa forma já possui determinadas qualidades, ligadas ao todo a que pertencem. Desse modo, mesmo campos muitos fracos podem afetar fortemente a partícula.

Entendo que isso vale para a mente, em que determinados conceitos, ainda que sutis, podem estar presentes em determinadas realidades, expressando o que muitas vezes é dito sobre a realidade espiritual, mas que significa exatamente a totalidade presente naquele momento, inclusive as formais totais sutis que permitem a compreensão do fenômeno. Bohm não usa exatamente a palavra “espiritual”, mas essa relação não pode ser excluída.

Talvez se possa dizer que essa questão espiritual diga respeito ao que Bohm chama de informação ativa presente no campo quântico, que dá forma, ou contexto, a determinada realidade. Explicando a informação ativa, ele dá o exemplo de um navio sendo controlado por controle remoto, as ondas de rádio ou mesmo como a forma como DNA contribui na síntese de proteínas.

“Our proposal is then to extend this notion of active information to matter at the quantum level. The information in the quantum level is potentially active everywhere, but actually active only where the particle is (as, for example, the radio wave is active where the receiver is). Such a notion suggests, however, that the electron may be much more complex than we thought (having a structure of a complexity that is perhaps comparable, for example, to that of a simple guidance mechanism such as an automatic pilot). This suggestion goes against the whole tradition of physics over the past few centuries which is committed to the assumption that as we analyze matter into smaller and smaller parts, their behaviour grows simpler and simpler” (Nossa proposta é, então, estender essa noção de informação ativa à matéria no nível quântico. A informação no nível quântico é potencialmente ativa em qualquer lugar, mas realmente ativa apenas onde a partícula está (como, por exemplo, a onda de rádio está ativo onde o receptor está). Tal noção sugere, no entanto, que o elétron pode ser muito mais complexo do que pensávamos (tendo uma estrutura de complexidade que talvez seja comparável, por exemplo, a um mecanismo de orientação simples como um piloto automático). Esta sugestão vai contra toda a tradição de física ao longo dos últimos séculos, que está comprometida com a suposição de que, ao analisarmos a matéria em partes cada vez menores, seu comportamento se tornará cada vez mais simples – Idem).

A perspectiva a ser adotada, portanto, é a da totalidade, pela qual a interação entre as partículas deve ser vista como dependente de um grupo comum de informações pertencentes ao sistema como um todo, de modo que não pode ser analisada apenas em termos de relações predeterminadas entre partículas individuais. Bohm dá o exemplo da supercondutividade, fazendo analogia, ainda, com a dança de balé, em que os dançarinos são guiados por um conjunto comum de informações, que envolve uma totalidade.

A totalidade, assim, tem significado objetivo, em que a realidade se comporta mais como um organismo do que como uma máquina, dizendo que, aprofundando a questão, a própria noção de informação ativa sugere a matéria como tendo um comportamento rudimentar semelhante à mente, em que a forma é essencial, da mesma forma que ocorre quando lemos um jornal, em que o que nos chama a atenção são as formas das letras, que carregam a informação, e não a substância do papel.

Passando ao processo do pensamento, o autor salienta que também é dependente da informação ativa, em que o contexto é determinante para a formação das ideias, de modo que as informações prévias podem condicionar o modo pelo qual as apreendemos e as estruturamos em um significado.

“It seems clear from all this that at least in the context of the processes of thought, there is a kind of active information that is simultaneously physical and mental in nature. Active information can thus serve as a kind of link or ‘bridge’ between these two sides of reality as a whole” (Parece claro por tudo isso que, pelo menos no contexto dos processos de pensamento, há um tipo de informação ativa que é simultaneamente física e de natureza mental. A informação ativa pode, portanto, servir como uma espécie de link ou ‘ponte’ entre esses dois lados da realidade como um todo – Idem).

Nosso pensamento pode conter uma variedade de informações de diferentes tipos, com níveis sutis que indiquem um todo maior, e que prenunciam outro maior. Essas redes sutis, assim, apontam para a interconexão entre os eventos, para a ordem implicada, na qual temos uma série de níveis inter-relacionados em que os mais sutis desdobram e envolvem aqueles que são menos sutis, e nestas séries o lado mental corresponde ao que é mais sutil e o físico ao que é menos sutil, e o lado mental se torna físico à medida que avançamos para níveis maiores de sutileza (In this series, the mental side corresponds, of course, to what is more subtle and the physical side to what is less subtle. And each mental side in turn becomes a physical side as we move in the direction of greater subtlety – Idem).

“For the human being, all of this implies a thoroughgoing wholeness, in which mental and physical sides participate very closely in each other. Likewise, intellect, emotion, and the whole state of the body are in a similar flux of fundamental participation. Thus, there is no real division between mind and matter, psyche and soma” (Para o ser humano, tudo isso implica uma totalidade profunda, na qual os lados mental e físico participam intimamente um do outro. Da mesma forma, intelecto, emoção, e todo o estado do corpo estão em um fluxo semelhante de participação. Assim, não há divisão real entre mente e matéria, psique e soma – Idem).

Finalmente, ele destaca a ideia de uma mente coletiva, algo que não é concebível pelo atomismo mental, que pensa exatamente o indivíduo como um átomo, ao invés de compreendê-lo como membro de um corpo maior, quase espiritual.

“Extending this view, we see that each human being similarly participates in an inseparable way in society and in the planet as a whole. What may be suggested further is that such participation goes on to a greater collective mind, and perhaps ultimately to some yet more comprehensive mind in principle capable of going indefinitely beyond even the human species as a whole” (Ampliando essa visão, vemos que cada ser humano participa de forma semelhante em uma forma indissociável na sociedade e no planeta como um todo. O que pode ser sugerido além disso, essa participação prossegue para uma mente coletiva maior, e talvez em última análise, para alguma mente ainda mais abrangente, em princípio, capaz de ir indefinidamente além da espécie humana como um todo – Idem).

A realidade mais profunda, assim, é algo além de mente ou matéria, que são apenas aspectos que nos ajudam a analisar o mundo.

Não é difícil associar as ideias do autor e de sua mente coletiva ao conceito do Deus do Monoteísmo, em suas acepções de Espírito, Logos ou Sabedoria do qual participamos, e que está além de nós (alguma mente ainda mais abrangente, em princípio, capaz de ir indefinidamente além da espécie humana como um todo).

O que deve ser destacado, enfim, é sua visão geral de mundo, fundada em seu profundo conhecimento da realidade física, rejeitando as concepções básicas do atomismo, tanto físico como mental, apontando para a interconexão entre todas as coisas e, como consequência lógica, para um mundo de tipo espiritual, subjacente aos processos mentais e a tudo o que existe.

Ayka, uma criatura divina

Deus é amor, e onde o amor verdadeiro se manifesta, ali Ele está.

Assim, a querida Ayka foi uma das formas pelas quais Deus me amou, dando-me um presente, uma dádiva, nos últimos dez anos, que hoje, contudo, porque muito amada, e porque também muito amou, deixa muita tristeza.

As perdas humanas são indizíveis, mas também a da Ayka o é, porque era uma parte diária da minha vida, o primeiro compromisso de todos os dias, de levá-la à rua, assim como o da volta do trabalho. Uma grande amiga, um grande amor, uma pequena grande parte de mim se foi.

Assim, era um compromisso prazeroso, de amor, de participação. Hoje, o Prince tem uma nova velha companhia; receba-a bem, amigo fiel.

O Mestre afirmou que os mansos herdarão a terra, e porque está prevista uma nova criação, um novo céu e uma nova terra, e como a terra é a habitação não só dos humanos, como também dos animais, penso que é correto presumir que também estes lá viverão, na nova criação, e como a Ayka é, talvez, o ente mais manso que já conheci, ela estará comigo, caso eu lá esteja. Conto com isso. Deus é bom, minha fé num Deus bom me permite, pois, crer nessa realidade.

A promessa, já realizada no mundo celestial, é: “Eis que eu faço novas todas as coisas” (Ap 21, 5).

Ele, que é fiel, promete que todas as coisas serão feitas novas, haverá um novo céu e uma nova terra, pelo que, dentre todas as coisas que serão feitas novas, a Ayka estará incluída, porque mansa, porque amada, porque uma criatura divina.

Adeus, querida; adeus, Kikita!

Nem-nem

O pensamento Cristão não é de esquerda ou de direita, é nem-nem.

Usar as categorias direita e esquerda, do ponto de vista do Cristianismo, é incidir em erro categorial, fato muito comum nos tempos modernos, em que as principais formas de pensamento padecem de inconsistências orgânicas e referenciais.

Nossa análise racional do mundo pressupõe a existência de categorias, que são formas racionais pelas quais medimos as coisas e acontecimentos, são instrumentos da inteligência para a apreensão do mundo, ou melhor, de aspectos do mundo que são destacados da totalidade existencial para um estudo específico e aprimorado daquele âmbito cognitivo. A especialização científica levou ao desenvolvimento de diversas categorias próprias, nos distintos ramos de atividades, permitindo detalhar os mais variados fenômenos da realidade, físicos, biológicos, sociológicos, jurídicos, religiosos etc.

O problema surgido desse desenvolvimento foi a perda do sentido de totalidade intelectual, na medida em que os saberes especializados passaram a abordar áreas cada vez mais isoladas da realidade, perdendo, em muitos casos, o contato com o mundo da vida, em sua complexidade e interconectividade, com a Religião.

A disputa política recente, o que vale para os âmbitos local e planetário, é um exemplo claro dessa ramificação cognitiva, em que cada lado somente consegue enxergar os defeitos dos opositores, ignorando, deliberadamente, ou não, os próprios. Uma das causas de tal situação é aquela ramificação cognitiva que impede sejam formuladas teorias mais abrangentes da realidade social, que incluam, especialmente, o componente religioso e o mundo espiritual, aspectos que, como regra, são, de plano, a priori, excluídos do debate científico, ou classificados como subjetivos ou com algum adjetivo intelectualmente depreciativo.

Um lado da disputa política está associada ao conservadorismo religioso, defendendo uma moralidade mais estrita, com os chamados costumes tradicionais, o que está, em meu ponto de vista, certíssimo, se amparado na mensagem de Cristo, em sua integralidade, moral e social. A outra vertente, por sua vez, tem o amparo de uma versão da chamada teologia da libertação, segundo a qual a questão social é fundamental, devendo ser dada a devida atenção aos excluídos e marginalizados, o que está, em meu ponto de vista, certíssimo, se amparado na mensagem de Cristo, em sua integralidade, moral e social.

A única forma de superar o impasse é exigir a coerência filosófica de ambos os lados, para que os valores comuns sejam destacados, notadamente quanto às suas origens cristãs, permitindo uma racionalidade comum que possibilite o desenvolvimento de argumentos sólidos capazes de convencer gregos e troianos, liberais e conservadores, direitistas e esquerdistas, judeus e muçulmanos (o raciocínio deve ser expandido, mas vale para eles também), que compartilhem aqueles valores comuns presentes no Evangelho de Jesus Cristo, que veio confirmar a Lei e os Profetas. O componente teológico sempre permitirá o surgimento de desavenças, mas na medida em que sejam adotados princípios e objetivos comuns, estes servirão para pautar o debate e impedir que o conflite passe ao plano de filigranas metafísicas praticamente insolúveis, casos para os quais a tolerância religiosa é indispensável.

De todo modo, um ponto inicial é adotar uma posição sobre o que significa ser Cristão, qual a natureza humana, que valores definem o que é de Cristo e humano e o que é do anticristo e bestial, o que é bom e deve ser estimulado e o que é mau e deve ser evitado, e criminalizado. Cristo e anticristo são categorias políticas fundamentais, incluindo o compromisso com a Verdade, filosófica e teológica, e as ações, públicas e privadas, condizentes com esse compromisso. Esse critério já permite concluir que os anticristos dominam a cena política.

Na palestra “Intolerância laicista e o bem comum da religião” (https://www.youtube.com/watch?v=vZyX_XItxo8&t=746s), Victor Sales Pinheiro destaca que o homem é um animal social racional, possuindo bens humanos básicos associados à sua natureza, como a vida, a saúde, a moradia, a sociabilidade, a experiência de beleza e conhecimento, incluída a especulação religiosa, e a razoabilidade prática.

A teoria política tem como uma de suas funções o debate público acerca de quais são esses bens, como devem ser alcançados, protegidos e distribuídos na sociedade, sendo uma questão fundamental para toda sociedade organizada. Não é por acaso que Aristóteles definia o homem como um animal político, zoon politikon.

A política está indissociavelmente ligada à religião, definida na palestra como “qualquer questionamento metafísico sobre a ordem da realidade”, que todo homem pode alcançar. Os bens humanos básicos devem ser promovidos pela comunidade, como a vida e o conhecimento, ainda que muitas pessoas continuem morrendo e sendo ignorantes, o que não leva ao fim da promoção de tais bens.

Seguindo, ao citar a obra de Finnis e a lei natural, Victor Sales Pinheiro destaca a necessidade de que a ação ética razoável inclua o bem comum, que é um critério tanto ético como jurídico, dentro da teoria da lei natural, que legitima a justiça da política. Da perspectiva do jusnaturalismo, não há separação entre questões morais e questões jurídicas, porque tratam dos mesmos temas.

Nesse ponto, a discussão política deve, necessariamente, debater temas religiosos, que são igualmente morais, porque dizem respeito a concepções de bem comum em disputa, e também à ordem da própria realidade, que será conduzida e transformada pelos agentes do Estado. Os agentes políticos são agentes (i)morais.

Da perspectiva Cristã, tenho sustentado a “Política como Teologia” (https://holonomia.com/2021/03/07/politica-com-teologia/, https://holonomia.com/2021/03/14/politica-como-teologia-parte-ii/, https://holonomia.com/2021/03/28/politica-como-teologia-parte-iii/), porque na medida em que a discussão envolve o que seja o bem comum, e sobre como o poder deve ser exercido para sua promoção, os valores mais elevados da comunidade sempre estão em disputa, o que inclui a própria noção de ordem, ou desordem, da realidade, porque haverá uma ordem fundada na realidade espiritual, segundo a perspectiva Cristã, ou uma ordem aparente, baseada na pura sorte, conforme o entendimento materialista de mundo, que, de fato, e de direito, em última instância, é amparado, por mais que isso soe absurdo, numa pretensa desordem do mundo. Além disso, a conduta daqueles que sustentam determinadas ideias deve ser compatível com tais ideias, é indispensável a coerência moral, ética e jurídica na ação pública dos agentes políticos, que são também agentes morais e religiosos.

Nesse sentido, a definição da natureza humana, a partir de quando a vida deve ser protegida, como devemos nos portar em comunidade, que espécie de beleza devemos considerar expressão artística, especialmente aquelas passíveis de exibição a crianças e adolescentes, são pontos essenciais do debate político e que não possuem uma resposta propriamente científica, da perspectiva do que hoje é concebido como tal, sendo esta resposta dependente exatamente da concepção da ordem de mundo, da ordem da realidade, ou de sua inexistência. Se a comunidade científica não responde a tais indagações, porque há uma limitação epistemológica impedindo que o faça, isso não impede que tais temas sejam debatidos do ponto de vista da racionalidade filosófica, na verdade exige que o sejam. O que não pode ser aceita é a imposição unilateral e acrítica da visão de mundo dos que acreditam no Caos, que é incompatível com o que pensam todos aqueles que acreditam no Cosmos, no que se incluem Judeus, Cristãos e Muçulmanos, a maioria absoluta da população mundial.

Assim, existe um problema na discussão política, de primeira grandeza, que é exatamente a natureza do debate e o que nele deve estar incluído, a discussão sobre a existência de ordem do mundo e que como isso se reflete na comunidade humana, e que valores ou bens humanos dizem respeito a essa ordem.

Não menos importante, e de similar grandeza, por outro lado, é a flagrante falta de compromisso com a Verdade e com a Justiça, nos discursos e ações dominantes no debate público contemporâneo, que segue a lógica maquiavélica, que é anticristã. Tecnicamente, desde o tempo de Cristo, o ambiente político é anticristão, reinando o que a Bíblica chama de bestas e monstros, amparados por falsos profetas, os pseudocientistas que negam a verdade religiosa e defendem que o mundo é regido pelo acaso. Em outros termos, vivemos a ditadura da inconsistência filosófica, da incoerência.

Se já é difícil chegar a um consenso quando as premissas do diálogo racional pecam por irracionalidade categorial, a partir do momento em que a hipocrisia é dominante nas ações das personagens principais dos agrupamentos políticos, e nem um lado e nem o outro, ambos com argumentos defensáveis, caso contrário não angariariam tantos adeptos, e desprezíveis, o que é evidente, aceita o escrutínio da Verdade, as perspectivas a curto prazo ficam seriamente comprometidas.

Contudo, a tribulação é necessária, antes que a Verdade de Cristo seja manifestada, em seu ambiente próprio, a Política, que é também a Teologia, porque é a essas categorias que se refere o Cristianismo, nem a uma nem à outra, mas a ambas, e enquanto elas estiverem separadas, tanto na teoria como na prática, os falsos messias e falsos profetas continuarão enganando a muitos.

E se aqueles dias não fossem abreviados, nenhuma vida se salvaria. Mas, por causa dos eleitos, aqueles dias serão abreviados. Então, se alguém vos disser: ‘Olha o Cristo aqui!’ ou ‘ali!’, não creiais. Pois hão de surgir falsos Cristos e falsos profetas, que apresentarão grandes sinais e prodígios de modo a enganar, se possível, até mesmo os eleitos. Eis que eu vo-lo predisse.

Se, portanto, vos disserem: ‘Ei-lo no deserto’, não vades até lá; ‘Ei-lo em lugares retirados’, não creiais. Pois assim como o relâmpago parte do oriente e brilha até o poente, assim será a vinda do Filho do Homem. Onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão os abutres.

Logo após a tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão do céu e os poderes dos céus serão abalados. Então aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem e todas as tribos da terra baterão no peito e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e grande glória. Ele enviará os seus anjos que, ao som da grande trombeta, reunirão os seus eleitos dos quatro ventos, de uma extremidade até a outra extremidade do céu.

Aprendei da figueira esta parábola: quando o seu ramo se torna tenro e as suas folhas começam a brotar, sabeis que o verão está próximo. Da mesma forma também vós, quando virdes todas essas coisas, sabei que ele está próximo, às portas” (Mt 24, 22-33).

Tu vens, tu vens

Eu já escuto os teus sinais