Ciência x tecnologia

O mundo presencia um enorme desenvolvimento tecnológico, a humanidade avançou incrivelmente no controle de partes do mundo natural, o que tem permitido melhorias na vida das pessoas, normalmente acompanhadas de um elevado custo econômico e social, pelas chamadas externalidades, o que muito limita o proveito desses benefícios, como regra restritos a minorias privilegiadas. Ainda que, com o passar do tempo, o restante da comunidade também tenha acesso a algumas dessas melhorias, no momento em que isso ocorre aquela minoria já usufrui outras vantagens materiais que chega a muito poucos.

A tecnologia é desenvolvida a partir de conhecimentos científicos, e apesar da esquizofrenia das ciências atuais, fruto da cisão cartesiana de mundo, o sucesso da tecnologia é retumbante, são impressionantes as possibilidades de incrementos para a humanidade, o que é capaz de enganar até os eleitos.

Ainda assim, vivemos no limiar da destruição planetária, tanto pelas questões climáticas quanto pelas ações humanas, e por isso pode ser constatada uma separação entre Ciência e tecnologia, um abismo entre o que a Ciência afirma sobre os riscos para a civilização e o mau uso constante da tecnologia, que continua nos empurrando em direção à catástrofe.

Desde a virada do século, acumularam-se em abundância evidências de que, embora o poder da ciência e da tecnologia tenha nos trazido benefícios nunca antes experimentados, as maneiras pelas quais esses benefícios são obtidos, e como eles são distribuídos entre os países e dentro deles, estão agora ameaçando o nosso bem-estar futuro, e, na verdade, a própria existência da humanidade” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 342).

O tempo em que vivemos é extraordinário, é um tempo histórico, de mudança de paradigma, que marca uma das grandes eras da humanidade, sendo, por isso, necessária, uma nova divisão das fases da História, tendo como base o conceito de humanidade, sua essência, sua Ciência.

Para isso, a divisão tradicional da História em cinco Idades, Pré-história, Antiga, Média, Moderna e Contemporânea, deve ser reformulada em seus marcos. Atualmente, a Idade Antiga começa com a escrita e termina com a queda de Roma, em 476 d.C., quando tem início a Idade Média, a qual dura até 1.453 d.C., seguida pela Idade Moderna, que finalmente é sucedida pela Contemporânea, cujo marco de surgimento é a Revolução Francesa, em 1.789 d.C.

Um fato relevante consiste em que os anos do calendário são divididos, no Ocidente, entre antes de depois do nascimento de Jesus Cristo, marco que deve ser mantido, porque é referência absoluta sobre os conceitos de humanidade, de dignidade humana e de direitos humanos, sendo usado inclusive para fins de definição dos períodos históricos, ainda que tenha havido erro inicial sobre a data de nascimento do Mestre, que se deu em torno de 5 a.C.. Nesse sentido, as ideias Cristãs tiveram impacto direto em todos os momentos da humanidade desde a sua divulgação, servindo para abalar o Império Romano, formar o Islamismo, que é impregnado ontologicamente da mensagem de Jesus Cristo, e fundamentar a filosofia que levou à Revolução Francesa, todos eventos definidores das divisões da História.

Portanto, mantendo-se a proposta de existência de uma Pré-história, mesmo que seus limites possam ser revistos, e com utilização dos mesmos conceitos gerais, a Idade Antiga deve ter como marco final o tempo do nascimento, vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo, eventos que, conforme exposto no artigo “Macroevolução e microevolução”, definem o surgimento da nova humanidade, do homem novo, ligado a Deus, ao Logos, à Plena Unidade Cósmica.

Como continuamos a viver os efeitos da Vida de Jesus, na medida em sua mensagem não foi colocada em prática pela humanidade, no mundo social, no plano político mundial, pode-se considerar que estamos na Idade Média, porque ainda vivemos um período intermediário na história da civilização, entre a proclamação da Boa Nova por Jesus Cristo e sua realização coletiva na era messiânica, entre a revelação do conceito de humanidade e sua efetivação na vida humana.

A Idade Média, assim como as demais, pode ser dividida em períodos internos, em sub-idades, notadamente em dois mais relevantes, a primeira Idade Média, em que prevaleceu uma concepção espiritual de mundo, com predomínio do controle religioso das comunidades, e a segunda Idade Média, iniciada no tempo que é chamado de Revolução Científica, quando o controle material da vida passou a preponderar.

No plano filosófico, a proposta cartesiana das duas substâncias, pensante e extensa, serve de limite figurativo entre a primeira e a segunda Idades Médias, uma dominada pelo pensamento, quando criadas as universidades, e outra pela manipulação do mundo extenso, pela experimentação material, desenvolvendo a tecnologia. Nesses dois períodos a ciência humana foi incompleta. Na primeira Idade Média prevaleceu a separação formal entre o que Agostinho de Hipona chamou de cidade dos homens e cidade de Deus, entre atividades políticas e atividades religiosas, ainda que na prática prevalecesse a cidade dos homens. Na segunda Idade Média, marcada pela separação entre mente e matéria, dominou a atitude materialista, restringido-se a realidade científica aos fenômenos físicos. Também na segunda Idade Média, o que justifica essa denominação para o fim do segundo milênio d. C., grupos humanos exploraram outros grupos humanos, a escravidão dos povos africanos enriqueceu nações europeias e grupos americanos, sem falar nas guerras, como as dos séculos XX, em que a barbárie praticada por motivos econômicos ofuscou as conquistas civilizatórias.

Do ponto de vista dos capitalistas europeus, o progresso científico representou poder dentro e fora do continente, pois as novas tecnologias, como os meios de transporte movidos a vapor e o telégrafo elétrico, permitiam o controle sobre extensas regiões do mundo. Muitos imperialistas acreditavam genuinamente contribuir para a melhoria de vida dos povos conquistados, e custavam a entender a recepção fria que recebiam. Hoje em dia, os políticos estão mais conscientes do potencial de destruição da ciência” (Patricia Fara. Uma breve história da ciência. 1 ed. São Paulo, SP: Editora Fundamento Educacional Ltda., 2014, p. 296).

A Idade Moderna, na qual estamos ingressando, tem um de seus marcos na era nuclear, uma vez que a orgânica quântica mostrou a insuficiência teórica da divisão cartesiana entre mente e matéria, demonstrando que o observador influi no que é observado, ou seja, a coisa pensante interage ontologicamente com a coisa extensa. Mas talvez o grande evento que lhe servirá de símbolo ainda não ocorreu, evento que conduzirá a humanidade à Unidade Teológica e teleológica, fundando-se na filosofia de Jesus Cristo, de unidade da humanidade, será o tempo da Parusia, da presença invisível de Jesus Cristo entre nós, e real em nós.

A Idade Média, que deixaremos no passado, é governada por ciências formais, por uma Ciência dividida em cidade dos homens e cidade de Deus e em ciências da natureza e ciências do espírito. Na cidade dos homens ocorre controle moral das pessoas, sem que a moralidade seja praticada pelos governantes, há mau uso do Direito e do Estado, e este usa a tecnologia para a dominação do homem pelo homem.

Atualmente, a maior parte do esforço planetário, dos recursos naturais e da energia, é despedida para um consumo irracional e a para a produção de armas.

A Grande Ciência que surgiu na primeira metade do século 20, movida por dinheiro, força de trabalho, máquinas, militarismo e mídia, era diferente em dois aspectos: a abrangência e a íntima ligação com os governos e as grandes organizações comerciais” (Patricia Fara. Uma breve história da ciência. 1 ed. São Paulo, SP: Editora Fundamento Educacional Ltda., 2014, p. 374).

A ciência nunca estivera tão misturada à política. Durante a Guerra Fria, programas de pesquisa aparentemente científicos também se voltavam para a busca do poder. No mundo inteiro, os governos disputavam posições, investindo boa parte do orçamento anual em duas áreas decisivas: voos espaciais e energia nuclear. (…)

No começo da corrida espacial, a ideologia antiga da ciência pura já se tornara insustentável. Os cientistas podiam acreditar que aceitavam verbas governamentais para fazer pesquisas, mas a ciência estava militarizada, e a política militar havia se tornado científica” (Idem, pp. 410-412).

Na Idade Média a tecnologia é desenvolvida prioritariamente para fins armamentistas, para a construção de instrumentos que servem para destruir a vida. Como existe toda uma estrutura econômica, social e de poder política ligada a esses objetivos, dificilmente a humanidade mudará seu rumo para Vida sem uma grande crise. A política internacional é pautada pela lei do mais forte, em que os valores econômicos se sobrepõem, preterindo os valores humanos. Vivemos uma crise de valores.

Essa crise é descrita nas Escrituras como grande tribulação, ou primeira batalha escatológica, que marca o fim da Idade Média, para que seja possível chegar à Idade Moderna, aquela na qual a tecnologia se unirá à Ciência, unificada como unidade do conhecimento, para a promoção da Vida, em que os valores humanos prevalecerão, a razão humana vencerá, o Logos reinará.

E acontecerá, no fim dos dias, que a montanha da casa de Iahweh estará firme no cume das montanhas e se elevará acima das colinas. Então, povos afluirão para ela, virão numerosas nações e dirão: ‘Vinde, subamos a montanha de Iahweh, para a Casa do Deus de Jacó. Ele nos ensinará os seus caminhos e caminharemos pelas suas vias. Porque de Sião sairá a Lei, e de Jerusalém a palavra de Iahweh’. Ele julgará entre povos numerosos e será o árbitro de nações poderosas. Eles forjarão de suas espadas arados, e de suas lanças, podadeiras. Uma nação não levantará a espada contra outra nação e não se prepararão mais para a guerra” (Mq 4, 1-3).

Certamente isto há de sobrevir, pois que está decidido, oráculo do Senhor Iahweh: Este é o dia de que falei. Então sairão os habitantes das cidades de Israel a queimar, a fazer fogo com armas, com escudos e paveses, com arcos e flechas, com bastões e lanças. Com eles farão fogo durante sete anos” (Ez 39, 8-9).

O Direito, como Ciência, que possui um lado tecnológico, relativo à criação e aplicação normativa, por meio do processo em contraditório, também será revisto em seus valores e suas finalidades, a política internacional promoverá a Justiça, o amor a Deus e ao próximo, em detrimento do amor ao dinheiro e ao poder.

Para isso, a tecnologia jurídica deixará de servir ao formalismo que pretende impedir a realização da Justiça, mantendo o status quo, para ser instrumento de promoção da Vida, em que a Constituição, como Norma Fundamental, pautará, por seus valores (o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça), a efetiva consecução de seus objetivos, construir uma sociedade livre, justa e solidária, para a realização do Reino de Deus predito por Jesus Cristo, em que aqueles que têm fome e sede de Justiça são saciados.

No futuro, então, finalmente, chegará a Idade Contemporânea, depois da segunda batalha escatológica, quando a macroevolução iniciada por Jesus Cristo se consumará pela Sua Presença ostensiva, com sua vinda gloriosa exercendo o Juízo Final, no Dia do Julgamento, quando a própria Ciência, como conhecimento de Deus, será a melhor tecnologia, da forma mostrada por Jesus Cristo ao manipular a matéria-prima e o potencial quântico, e até os mortos serão julgados, com Justiça, quando o tempo dos homens será contemporâneo com o de Deus, quando houver novos céus e nova terra, quando a cidade dos homens se unirá definitivamente à cidade de Deus, será plenamente a cidade de Deus.

Não vi nenhum templo nela, pois o seu templo é o Senhor, o Deus todo-poderoso, e o Cordeiro. A cidade não precisa do sol ou da lua para a iluminarem, pois a glória de Deus a ilumina, e sua lâmpada é o Cordeiro. As nações caminharão à sua luz, e os reis da terra trarão a ela sua glória; suas portas nunca se fecharão de dia — pois ali já não haverá noite? —, e lhe trarão a glória e o tesouro das nações. Nela jamais entrará algo de imundo, e nem os que praticam abominação e mentira. Entrarão somente os que estão inscritos no livro da vida do Cordeiro” (Ap 21, 22-27).

Nunca mais haverá maldições. Nela estará o trono de Deus e do Cordeiro, e seus servos lhe prestarão culto; verão sua face, e seu nome estará sobre suas frontes. Já não haverá noite: ninguém mais precisará da luz da lâmpada, nem da luz do sol, porque o Senhor Deus brilhará sobre eles, e eles reinarão pelos séculos dos séculos” (Ap 22, 3-5).

Macroevolução e microevolução

O tema da evolução das espécies é objeto de controvérsia entre cientistas e entre estes e religiosos. Como escrevi no artigo “Revolução e evolução” (https://holonomia.com/2017/08/03/revolucao-e-evolucao/):

Ressalte-se que o próprio Darwin não considerava sua teoria incompatível com a criação, pois ele aceitava a ideia de leis naturais, as quais tornam possível a evolução. Para Vittorio Hölse, que afirma ser necessária uma interpretação teleológica da natureza, podemos ver finalismo no mundo como um todo, o que também ocorre na evolução darwiniana. Hösle transcreve as seguintes palavras de Darwin: ‘When thus reflecting I feel compelled to look to a First Cause having an intelligent mind in some degree analogous to that of man; and I deserve to be called a Theist’ (In, Vittorio Hösle. God as reason: essays in philosophical theology. Notre Dame, Idiana: University of Notre Dame, 2013, p. 29). Em tradução livre: ‘Quando assim refletindo, eu me sinto compelido a procurar por uma Primeira Causa tendo uma mente inteligente, em certo grau análoga à do homem; e eu mereço ser chamado um Teísta’. Contudo, posteriormente, mesmo tendo dito que passou por uma experiência quase religiosa quando esteve nas florestas do Brasil, Darwin não mais se declarou teísta, mas agnóstico (Idem, p. 33). E Hösle ainda ressalta, como antes salientado, que a visão de mundo religiosa é a base da ciência moderna: ‘There is little doubt nowadays among historians of science that the miracle of modern science was profoudly rooted in a religious vision of the world’ (Ibidem), ou seja, ‘há poucas dúvidas hoje em dia entre os historiadores da ciência de que o milagre da ciência moderna estava profundamente enraizado em uma visão religiosa do mundo‘.

Sobre isso, referindo-se a palavras de Asa Gray, Hösle afirma que a disputa (atualmente entre os neodarwinistas ateus e os teístas) não era entre darwinismo e criacionismo, mas entre acaso e desenho. Aduz, Hösle, ainda, que a evolução é compatível com a mente consciente como o desenvolvimento de fins mais complexos: ‘bringing forth entities that have increasingly complex ends is, so to speak, an end either of nature or of its creator; and the highest end is the generation of a being that can ask the question of what an ultimate end is’ (Idem, p. 48), isto é, ‘produzir entidades que têm fins cada vez mais complexos é, desse modo, um fim da natureza ou de seu criador; e o mais alto fim é a geração de um ser que pode fazer a pergunta sobre o que é um fim supremo’”.

Portanto, volto ao assunto porque ele também é mencionado por Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi, no livro citado no artigo anterior, ao abordarem a disputa entre acaso e desenho, negando a existência de Desenho Inteligente, porque esta ideia carregaria “consigo ignorância e concepções errôneas sobre a ciência”, além de pregar “a ignorância e o medo”, sendo uma “nuvem de falsidade” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 264).

Capra e Luisi, seguindo a proposta de Humberto Maturana, sustentam a existência de um “determinismo estrutural”, pelo qual o comportamento dos organismos não é determinado por forças externas, mas por suas próprias estruturas, que são formadas a partir de sucessivas mudanças estruturais. Ao determinismo estrutural, junta-se a ideia de contingência, substituindo a noção de acaso, como uma força motriz da evolução: “contingência, definida no dicionário como ‘uma ocorrência imprevisível’, é a ocorrência simultânea de fatores que são independentes uns dos outros, mas que, juntos, determinam um evento específico em uma situação temporal espacial precisa” (Idem, p. 265).

Nesse ponto, os citados autores adotam procedimento semelhante ao de Stephen Hawking, como citei no artigo “Ciência: a luta do cosmos contra o caos” (https://holonomia.com/2016/08/13/ciencia-a-luta-do-cosmos-contra-o-caos/):

Stephen Hawking, o arauto do ateísmo materialista moderno, afirma que ‘na teoria quântica, a capacidade de fazer previsões exatas é apenas a metade do que era na visão de mundo clássico de Laplace. Todavia, dentro desse sentido restrito, ainda é possível afirmar em determinismo’ (In O universo numa casca de noz. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 108). Nesse ponto ele deturpa o conceito de determinismo, para tentar manter sua posição científica, como a ideia de uma mulher meio grávida”.

Isso porque o “determinismo estrutural” pode incluir uma estrutura ainda mais sutil, com um determinismo completo, que se mostra fenomenologicamente como contingência, ou seja, que possui aparência material de aleatoriedade, sem, de fato, haver acaso, porque o conceito de cosmos inclui o de ordenação completa. Depois que foi comprovado o entrelaçamento quântico é difícil sustentar a existência de fatores independentes no mundo físico. O fato de não conhecermos a estrutura última da natureza, inclusive no possível (provável) nível subquântico, não impede que exista essa realidade sutil, que determina estruturalmente tudo o que ocorre, o Cosmos que organiza a si próprio.

Essa controvérsia, abordada no artigo “Ciência: a luta do cosmos contra o caos”, se o mundo é regido por uma ordem absoluta ou pelo acaso, é uma divergência é radical, que separa duas visões de mundo, um que é governado por Deus, pelo Logos, e outro em que não há ordem, mas caos e coincidências aleatórias.

Como tenho sustentado em meus escritos, defendo uma visão de mundo Cristã, que pressupõe a existência de ordem, de uma Razão Universal, de um Logos, de um Cosmos, de um Deus, onisciente, onipresente e onipotente, perspectiva essa incompatível com o darwinismo, ou seja, com a “noção de que a natureza procede de maneira aleatória em seu desenvolvimento – ou seja, sem obedecer a qualquer plano predeterminado” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 234).

Portanto, ainda que Capra e Luisi substituam o termo “acaso” por contingência, como visto acima, apesar da sua compreensão de uma imprevisibilidade material da evolução, segundo penso, para que haja ciência autêntica, para que haja Cosmos, demanda-se a existência de uma previsibilidade ideológica, ou espiritual, de plena Unidade.

Além disso, o conceito de evolução inclui a ideia de uma mudança temporal, da evolução que ocorre no tempo, e a natureza do tempo é duvidosa desde as descobertas da física moderna, tando da relatividade quanto da orgânica quântica, pelas quais pode haver algo fora do espaço-tempo, Eterno…

Para a luz não há tempo, uma vez que em sua perspectiva tudo é instantâneo, também não havendo tempo nos fenômenos de entrelaçamento quântico. Portanto, o conceito científico de evolução das espécies é incompleto, porque a física moderna pressupõe uma Inteligência Cósmica não local e não temporal, um Logos, que não se limita ao espaço, não se limita ao tempo, que existe instantânea a atemporalmente, pelo que a própria ideia de evolução se mostra, nesse sentido, parcial, e relativa

Como cientista, outrossim, entendo que negar a hipótese evolutiva é negar os fatos, negar a razão, pois o conceito de evolução é evidente na observação da natureza, desde a evolução cósmica até o desenvolvimento de uma simples planta, não sendo razoável sustentar que Deus criou o mundo há seis mil anos. De outro lado, também pode ser considerada uma ofensa à racionalidade a narrativa segundo a qual o mundo é regido pelo acaso ou por contingências imprevisíveis, que contraria o princípio segundo o qual o mundo é organizado, porque pode-se ver organização e ordem no universo, e não confusão e caos. Sustentar acasos e coincidências é menosprezar a inteligência humana e a própria dignidade humana.

Se a evolução é fruto do acaso, isso tem profundas implicações filosóficas e para a vida prática humana e social, para o mundo jurídico, porque segundo esse pensamento não há diferença ontológica entre o homem e uma vaca, ou um chimpanzé. Se a vida humana é acidental, não é necessária, não é essencial ou qualitativamente mais valiosa do que a dos animais. Se o mundo é governado pela aleatoriedade, o comportamento daqueles que praticam massacres, matando dezenas de desconhecidos, não pode ser considerado irregular, ou ilícito, pensamento que é socialmente desastroso.

Esse ponto também serve para fundamentar a superioridade do Cristianismo em relação às demais religiões, ao conferir maior dignidade ao ser humano, compreendido como Filho de Deus, ao contrário de outras ideias religiosas que consideram sagrados animais irracionais.

Portanto, minhas principais críticas ao darwinismo, em que pese aceitar a tese de que há evolução (no tempo), consistem nas hipóteses pouco filosóficas de que a evolução é aleatória e de que ela é gradual. Sobre o segundo ponto, há dúvidas em relação à sua ocorrência, porque com a união do darwinismo com a genética populacional:

Aceitou-se que as características são herdadas como entidades discretas, chamadas de genes, e que a especiação se deve, muitas vezes, ao acúmulo gradual de pequenas mudanças genéticas – a macroevolução é simplesmente uma grande quantidade de microevoluções.

Desse modo, a síntese moderna é uma teoria sobre como a evolução funciona no nível dos genes, fenótipos (isto é, o aparecimento real do seres vivos e do seu comportamento) e populações. A principal controvérsia se referia – e, em parte, ainda se refere – à relação entre micro e macroevolução, controvérsia que surge, por exemplo, da objeção de que o registro fóssil, em qualquer sítio arqueológico, não mostra mudança gradual, mas, em vez disso, longos períodos de estabilidade seguidos de rápida especiação” (Fritjof Capra e Pier Luigi Luisi. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. Trad. Mayra Teruya Eichemberg, Newton Roberbal Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2014, p. 236) (Grifo nosso).

Essas noções de microevolução e macroevolução podem levar à conclusão de que pequenas ideias, erradas ou certas, quando multiplicadas, levam a grandes erros ou grandes acertos, que ocorrem em saltos. Tal proposta justifica o mandamento Cristão de ser santo como Deus é Santo, para que sejam evitados até os pequenos erros.

Por isso, diversamente do que sustentava a tese evolutiva clássica, como provado pela física moderna, notadamente a orgânica quântica, a natureza dá saltos.

Dentro da visão Cristã podem ser constatadas noções de microevolução e macroevolução, ambas ligadas à pessoa de Jesus Cristo, que individualmente é a evolução individual humana, uma microevolução, ao mesmo tempo em que é e antecede a macroevolução social e física, a formação de uma nova forma de organismo, a humanidade como unidade orgânica e cósmica, que se completará como Reino de Deus, seguida de uma macroevolução ainda mais ampla, quando surgirão novos céus e nova terra.

Nesse sentido, o Cristianismo é uma teoria científica evolucionista e antecipou a ideia de evolução, mas com uma visão da evolução para o futuro, e não apenas para o passado, em que Jesus Cristo é o início do homem novo, a nova humanidade, a Vida que nasceu da vida, que já existe, mas ainda não se manifestou plenamente. A macroevolução já começou pela microevolução iniciada por Jesus CristoA proposta evolutiva é clara em são Paulo:

Primeiro foi feito não o que é espiritual, mas o que é psíquico; o que é espiritual vem depois. O primeiro homem, tirado da terra, é terrestre. O segundo homem vem do céu” (1Cor 15, 46-47).

A macroevolução provavelmente se desenvolve em saltos, após períodos de crise, como nas várias extinções em massa já ocorridas no planeta, que permitiram novas formas de vida.

Assim, a ideia de grande tribulação, como crise que antecede a chegada do Reino de Deus, pode ser vista como evento catalisador da desordem antes que a nova ordem se forme, é bastante científica e coerente com nossos conhecimentos racionais, quando após um acúmulo de energia ocorre um salto evolutivo, um salto quântico biológico, um salto qualitativo, como aqueles ocorridos nos níveis mais básicos da realidade.

Apesar da entropia, do aparente aumento da desordem, seguindo a segunda lei da termodinâmica, a evolução implica aumento da complexidade, com uma ordem cada mais sutil, em comparação com a ordem anterior.

E é importante ressaltar que o salto quântico, pelo que se conhece até o momento, não possui fase de transição, pois o momento de maior energia é desconhecido até o instante em que a passagem já ocorreu, sem duração de tempo.

Nessa linha de raciocínio, a macromudança, em termos humanitários, se decorrer da dominância da ideia de separação das pessoas implica em desordem global, o que é uma macroinvolução, pelo reino do anticristo que vivenciamos, colocando em risco a civilização e a vida no planeta; de outro lado, a dominância da unidade do Espírito leva ao Reino de Deus, a efetiva macroevolução humana, já antecipada em Jesus Cristo, que é inafastável, dentro da cosmovisão Cristã.

Ele é a Imagem do Deus invisível, o Primogênito de toda criatura, porque nele foram criadas todas as coisas, nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis: Tronos, Soberanias, Principados, Autoridades, tudo foi criado por ele e para ele. Ele é antes de tudo e tudo nele subsiste” (Cl 1, 15-17).

A unidade cósmica, o Logos, manifestou-se inicialmente em Jesus Cristo, modelo de comportamento que se expandiu pelo globo, ainda que a Ideia tenha sido divulgada com falhas estruturais, por ter sido semeado joio junto com o trigo, fato antecipado pela teoria, que corrobora sua cientificidade, até que as incoerências sistêmicas sejam corrigidas, quando haverá um salto em direção à macroevolução, durante a era messiânica, em que a energia humana se aliará às forças cósmicas, pela obediência à Lei, com progresso humano nunca antes experimentado.

Ao final desse período, finalmente, a macroevolução ocorrerá, para uma Vida ainda mais sutil, que incluirá as vidas já vividas, pela ressurreição dos mortos, em um novo ambiente cósmico, “um novo céu e uma nova terra” (Ap 21, 1); sim, a trombeta tocará, e os mortos ressurgirão incorruptíveis, e nós seremos transformados” (1Cor 15, 52).

Ainda que a imprevisibilidade material impeça o conhecimento das propriedades emergentes do novo ciclo evolutivo, o Espírito Santo já as revelou, parcialmente, confirmando que a evolução continuará: “O que está sentado no trono declarou então: ‘Eis que eu faço novas todas as coisas’” (Ap 21, 5).