Como o Dever se transforma em Ser na medição (quântica)

A unidade lógica do mundo, exigida pela Filosofia, indica a correlação (ou emaranhamento quântico) entre Dever e Ser, apesar do pensamento dominante em sentido contrário.

Nesse ponto, vale relembrar a diferença ontológica entre os conceitos verbais de ser e estar, do que decorre a diferenciação entre os substantivos ligados aos respectivos verbos, pelo que o ser é essencialmente diverso do estar na perspectiva do tempo ou movimento. Isso porque o ser não tem duração, transcendendo qualquer concepção temporal, o ser é, e daí Deus dizer “Eu sou”, pois Ele é Espírito (eterno): “Eu sou o Alfa e o Ômega, diz o Senhor Deus, ‘Aquele-que-é, Aquele-que-era e Aquele-que-vem’, o Todo-poderoso” (Ap 1, 8). O estar, ao contrário, tem duração, está no tempo, ligado ao movimento, entre o que era e o que será. O estar tem uma significação material e provisória, enquanto a do ser é espiritual, ideal ou imaterial, e permanente.

De outro lado, o estar pode ser referir ao ser, notadamente quando se conecta ao seu devir, ao Espírito, ao Logos, ao que era e ao que será. Nessa situação o dever do estar se transforma em ser, o estar é o que deve ser, tornando presente em si o seu devir.

Portanto, fazendo uma utilização da teoria física de movimento, enquanto variação espacial e temporal do ente, ligando-se à ideia de início e fim de um movimento, pela evidente dificuldade, inclusive matemática, de se pensar o movimento eterno com seus cálculos infinitos, conectam-se facilmente os conceitos de ser, estar e devir, de modo que o ser é a unidade inteligente do movimento, considerada a vinculação entre os seus pontos de partida e de chegada, o estar é qualquer desses momentos do movimento e o devir a passagem de um estar a outro. A lei de transformação de um estado a outro, de manutenção da unidade do ser, é o dever.

Como sempre estamos no meio do movimento, na medida em que o tempo não acabou, sem a perspectiva correta do fim (como causa e destino, ou finalidade) do movimento é dificultosa, quiça impossível, compreender a lei do movimento, ou o dever. A lei ou dever é o que conecta passado e futuro.

No mundo quântico essa ligação entre o que foi e o que será é de uma complexidade ímpar, sendo o conhecimento desse devir materialmente limitado pelo princípio da incerteza, segundo o qual o dever é transformado em probabilidade. No desenvolvimento da teoria física, atualmente fala-se de sistemas dinâmicos, tema ligado ao que se chama teoria do caos, que usa um conceito de caos não como desordem mas como ordem instável. Ao discorrer sobre isso, no artigo “Ilya Prigogine: uma contribuição à filosofia da ciência”, Neusa Teresinha Massoni, escrevendo sobre as divergências decorrentes de interferências entre os fenômenos, que apontam, segundo Prigogine, para um sistema dinâmico não local, o qual passa por pontos críticos que determinam a quebra de simetria entre passado e futuro, escreve:

As divergências não aparecem no nível estatístico. A estatística, assim, é incluída para resolver a não analiticidade do problema original. Nos pontos críticos, cada ponto (po) do espaço de fases pode ser associado não a um ponto (pτ) que poderia ser predito com certeza como sendo o estado do sistema decorrido um tempo τ, mas a um conjunto de pontos (p1, p2, p3, …), sendo que cada um destes pontos tem probabilidade não nula de vir a representar o sistema. Sistemas que apresentam essas propriedades são precisamente sistemas dinâmicos caóticos” (In http://www.scielo.br/pdf/rbef/v30n2/a09v30n2.pdf).

Em forma simples, podemos dizer que sistemas dinâmicos passam por crises no seu movimento temporal, e nessas crises são várias as possibilidades da posição futura do sistema, posição futura que estará ligada a um determinado ponto possível que, realizado, terá em si a significação do movimento de todo o sistema em questão.

Segundo a física, portanto, tratando dos sistemas dinâmicos, relativos ao que se entende como sendo a estrutura da realidade, existe uma indeterminação material sobre o devir, sobre a posição futura do sistema, e somente há possibilidade de conseguimos entender a lei do sistema, que levou o movimento do estado passado ao estado futuro, depois que os eventos ocorreram, em uma análise retroativa em perspectiva. Assim, depois da medição pode-se entende o dever em seu ser.

O dever, portanto, ser liga a uma concepção histórica do ser, do caminho (provável, segundo a física) percorrido do início ao fim do movimento, ou da lógica deste deslocamento. Nesse sentido, as leis da física descrevem a matemática dos movimentos das partículas, seu deslocamento pelo espaço e pelo tempo.

No âmbito jurídico, e nas chamadas ciências do espírito, ou ciências humanas, prevalece a ideia de separação entre ser e dever, entre natureza e moralidade, e para compreensão da questão, faço transcrição do artigo “Indução e Verdade: os problemas da ciência moderna” (https://holonomia.com/2017/03/05/inducao-e-verdade-os-problemas-da-ciencia-moderna/), em que cito o autor Ronald Dworkin:

O grande filósofo escocês David Hume declarou que nenhuma quantidade de saber empírico sobre o estado do mundo – nenhuma revelação sobre o curso da história ou sobre a natureza da matéria ou a verdade sobre a natureza humana – pode estabelecer qualquer conclusão sobre o que devia ser sem uma premissa ou assunção adicional sobre o que devia ser*. O princípio de Hume (como chamarei a esta asserção geral) é frequentemente visto como tendo uma clara consequência cética, uma vez que sugere que não podemos saber, através apenas do conhecimento que temos disponível, se alguma das nossas convicções éticas ou morais é verdadeira. De facto, como digo na parte I, o seu princípio tem a consequência oposta. (…) O princípio de Hume, devidamente compreendido, defende não o ceticismo em relação à verdade moral, mas antes a independência da moralidade enquanto departamento separado do conhecimento, com os seus próprios padrões de investigação e de justificação. Requer que rejeitemos o código epistemológico do Iluminismo para o domínio moral” (In Justiça para ouriços. Tradução de Pedro Elói Duarte. Coimbra: Almedina, p. 29).

Este princípio (de Hume) afirma que nenhuma série de proposições sobre como o mundo é, enquanto facto científico ou metafísico, pode fornecer argumentos – sem algum juízo de valor escondido nos interstícios – para uma conclusão sobre o que deveria ser o caso” (Idem, p. 55).

Voltando à distinção entre os conceitos de ser e estar, é possível concluir que o chamado princípio de Hume teria validade para a análise de cada estar isoladamente, para um estado específico do ser, porque para dizermos o que ou “como mundo é” se exige nós a compreensão completa do tempo, passado, presente e futuro, da História, e desse conhecimento efetivamente decorre o entendimento de seu devir, do dever ligado à unidade do ser.

E existem duas concepções, ou leituras possíveis de futuro, opostas sobre o entendimento da História, um ramo da Ciência com aproximadamente duzentos anos, a concepção materialista, baseada em Marx, e a espiritualista ou idealista, fazendo uma abordagem religiosa do mundo, podendo ser citado o exemplo da proposta de Hegel. Ainda que a visão de Hegel não tenha se concretizado como foi por ele prevista, pois, diversamente de sua hipótese, a Alemanha desempenhou um papel contraditório no começo do século XX, negando os valores éticos Cristãos defendidos por Hegel, a visão não material da História ainda é sustentável e, creio, em breve voltará a ser dominante.

A narrativa histórica, e a respectiva concepção de dever, outrossim, é dependente de uma visão de mundo, de uma metafísica ou uma teologia, ao estabelecer uma unidade entre os eventos passados e presentes, apontando para um futuro, além do estado atual das coisas. A metafísica define o contexto segundo o qual o momento é interpretado, em retrospectiva ou prospetiva.

Para o materialismo, com seu contexto limitado, não há sentido ou ordem subjacente no mundo ou na História, que são frutos de meros acasos e coincidências, sem um plano maior predeterminado, pelo que cabe ao homem determinar o seu futuro. Portanto, não há um devir específico, porque o futuro é totalmente incerto, e não há um dever ontológico, prevalecendo o relativismo ou convencionalismo moral. Assim, para o materialismo, efetivamente não existe ser ou, consequentemente, dever, apenas estados e possibilidades.

De outro lado, existe a visão espiritual do mundo, notadamente o Cristianismo em sua versão primitiva, ao entender que Deus governa o mundo, que possuiu uma ordem, e estabelecerá seu Reino na História, no chamado milênio, na era messiânica. Para os Cristãos, há um princípio (ainda que temporalmente relativo) para todas as coisas, o que foi recentemente (em termos históricos) comprovado a partir do estudo do padre belga Georges Lemaître, que deu origem à teoria do Big Bang, e haverá um fim, sem perda de unidade simbólica entre um evento e outro, pois ambos estão na previsibilidade do mesmo Logos de Deus.

Portanto, para a Teologia Cristã a História possui um sentido, há plena conexão lógica entre passado, presente e futuro, mesmo que ainda não compreendamos tal fato, existindo uma teleologia no devir do Ser, do que decorre a existência de um Dever segundo o qual o Ser é, de um estar a outro, incluindo tudo o que existe no cosmos, matéria e energia, corpos e pensamentos.

Portanto, mesmo que vivamos em um sistema dinâmico com uma indeterminação material do futuro, é possível, pelo Espírito, alcançar o ponto futuro da História, pois o Espírito está além do tempo e da mudança. Assim, ao homem, por ser templo do Espírito de Deus, é possível alcançar a unidade simbólica da História, incluindo os eventos futuros, ou seja, o ponto p1, p2 ou p3 que representará o sistema depois de um determinado período de tempo, porque a Lógica, ou Logos, é a mesma em todo o sistema cósmico.

Os livros proféticos e o livro do Apocalipse, além de outras profecias como as dos evangelhos ou das cartas de Paulo Apóstolo, expressam essa visão da unidade da História, revelada pelo Espírito, mostrando como estará a humanidade em momentos relevantes para a realização do Reino de Deus, em pontos futuros possíveis, que, no passado, tinham probabilidade não nula de representarem o sistema.

Como a metafísica define o contexto segundo o qual o momento é interpretado, sobre como compreender o devir e o dever, a metafísica também é relevante no âmbito jurídico, porque condiciona a compreensão sistêmica da norma fundamental e de como regular o comportamento humano segundo seus movimentos, para manutenção da unidade simbólica e real do mundo.

Por isso o maior e o primeiro mandamento é “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento” (Mt 22, 37), que obriga todo Cristão, Filósofo ou Cientista a ser um teólogo, no sentido de conhecer Deus, buscar a compreensão de Deus, da Ordem, do Cosmos. Esse amor e esse entendimento de Deus levam à união com Ele, ao emaranhamento quântico que nos conecta ao Espírito, à eternidade, que não é limitada pelo tempo ou pelo espaço, pois regida pela não localidade quântica.

O conhecimento de Deus, do Logos, no Espírito, dá o correto contexto para interpretação dos fenômenos do mundo, de modo que o sistema integral das coisas seja considerado na tomada de decisões.

A falta de conhecimento de Deus leva à idolatria, ao pecado, à irracionalidade. Por isso, segundo a medição material dos fenômenos prevalece a imprevisibilidade, a incerteza, que limita a medição quântica material do mundo, prejudicando a compreensão do seu ser, e seu dever.

A medição quântica acarreta a união entre observador e observado, enquanto a medição quântica do Espírito leva à união entre observador e O Observador, e daí ao conhecimento do Dever que, cumprido, realiza o Ser, em sua Unidade e Eternidade, conforme método de Jesus Cristo, o Caminho para Deus.

Por isso, apenas na visão espiritual, na medição quântica imaterial, e não local, é possível a manutenção da unidade do Ser e a compreensão do Dever que lhe é inerente, que antecipa o devir. Desse modo, viver segundo o Espírito é viver no Dever que se transforma no Ser que sempre é, motivo pelo qual “Jesus Cristo é o mesmo, ontem e hoje; ele o será para a eternidade!” (Hb 13, 8). Daí a atualidade de sua mensagem, porque tirou o pecado ou erro do mundo científico, é voz de Deus, é O Profeta do Logos eterno, da Razão, do Dever que encarna no Ser.

Eu Sou a Fonte do Direito

Eu Sou é uma expressão com um significado originário especial.

Moisés disse a Deus: ‘Quando eu for aos filhos de Israel e disser: ‘O Deus de vossos pais me enviou até vós’; e me perguntarem: ‘Qual é o seu nome?’, que direi?’ Disse Deus a Moisés: ‘Eu sou aquele que é.’ Disse mais: ‘Assim dirás aos filhos de Israel: ‘EU SOU me enviou até vós.’ ‘Disse Deus ainda a Moisés: ‘Assim dirás aos filhos de Israel: ‘Iahweh, o Deus de vossos pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó me enviou até vós. Este é o meu nome para sempre, e esta será a minha lembrança de geração em geração”” (Ex 3, 13-15).

O Ser é o objeto da filosofia, que busca o conhecimento das coisas. O Ser é, é perene, é eterno, é pleno, é integral é íntegro.

A língua portuguesa tem uma grande vantagem em relação às demais línguas ocidentais, pois possui dois verbos, “ser” e “estar”, que indicam situações com significações filosóficas e ontológicas próprias, enquanto outras línguas usam o mesmo verbo para ambos os significados, como o “to be” inglês, o “sein” alemão, o “essere” italiano, o “être” francês.

Ao dizer Eu Sou, enquanto verbo intransitivo, isso indica que tenho uma qualidade relativa a Deus, que É, sempre. Para dizer corretamente Eu Sou é preciso uma consciência de eternidade, ligada ao que sempre fui e sempre serei, à minha essência permanente, enquanto unidade psíquica individual, caso contrário o correto seria dizer eu estou. Apenas o homem tem a capacidade, a possibilidade, de dizer Eu Sou, porque somente o homem tem em si a imagem de Deus, o Espírito de Deus, que É. Esse fato nos foi relembrado por Jesus Cristo, que nos regenerou como humanidade.

Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, em sua grande misericórdia, nos gerou de novo, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma esperança viva, para uma herança incorruptível, imaculada e imarcescível, reservada nos céus para vós, os que, mediante a fé, fostes guardados pelo poder de Deus para a salvação prestes a revelar-se no tempo do fim” (1Pe 1, 3-5).

A ressurreição é fundamental porque comprovou o Ser de Jesus Cristo, além de seu estar corporal. Essa consciência ele transmitiu à humanidade por sua morte e ressurreição, transcendendo o mero estar no corpo, estar vivo, mostrando seu Ser, de que Ele já tinha consciência anteriormente, notadamente quando afirmou “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”, e por expressar isso foi morto pelos judeus, que não aceitaram a identificação do homem com Deus.

O Sumo Sacerdote o interrogou de novo: ‘És tu o Messias, o Filho o Deus Bendito?’ Jesus respondeu: EU SOU. E vereis o Filho do Homem sentado à direita do Poderoso e vindo com as nuvens do céu‘, O Sumo Sacerdote, então, rasgando as suas túnicas disse: ‘Que necessidade temos ainda de testemunhas? Ouvistes a blasfêmia. Que vos parece?’ E todos julgaram-no réu de morte” (Mc 14, 61-64).

Disseram-lhe, então, os judeus: ‘Não tens ainda cinquenta anos e viste Abraão!’ Jesus lhes disse: ‘Em verdade, em verdade, vos digo: antes que Abraão existisse, EU SOU’. Então apanharam pedras para atirar nele; Jesus, porém, ocultou-se e saiu do Templo” (Jo 8, 57-59).

Portanto, muito antes da filosofia grega, desde Moisés, o povo hebreu já se preocupava com a questão do Espírito, do Ser, da natureza das coisas além das aparências transitórias.

A Queda significa a identificação do homem com seu corpo, com o seu estar, com sua provisoriedade temporal, o Resgate, a Salvação levada a termo por Jesus Cristo, foi a restauração do homem como Espírito, e, como tal, eterno. Jesus tornou a transcendência do Ser imanente em Seu estar, mostrando como o ente pode ser adequar ao Ser, e essa é a Redenção, permitir que o homem seja filho de Deus, Seja.

O estar é uma situação provisória do Ser, sendo o Ser a causa do estar, a causa do ente. O apego ao estar é não Ser. Deus, o Eterno, criou todas as coisas, que estão em determinado estado do movimento, estado que pode estar conectado ou não à essência, ao Ser. O que está, não estava, e decorre da alteração de um estar anterior, que não mais está, tudo isso dentro do Ser, que sempre é.

Desde os filósofos pré-socráticos a questão do Ser e do Devir foram enfrentadas, especialmente por Parmênides, dizendo que tudo que é real é eterno e tem uma unidade, e por Heráclito, salientando que tudo flui e está em permanente mudança, havendo uma unidade além dos opostos.

A filosofia atual é majoritariamente caída, como em Heidegger e Gadamer, para os quais o homem ou Dasein é o corpo, ou a ideia, que aqui está, o ente preocupado com sua morte e suas razões particulares. Essa filosofia se liga ao verbo “estar”, o que indica um ente provisório, de um tempo limitado, enquanto a filosofia autêntica se refere ao Ser, o que sempre é, mesmo mudando.

Essas filosofias se limitam à discussão da consciência do ente, de um estado, não alcançando a consciência cristã, que Jesus Cristo atingiu e nos transmitiu, a consciência de unidade com Deus, a Consciência de Ser, de eternidade, pelo que podia dizer “Eu e o Pai somos um”. A prova disso consiste no simples fato de que ainda hoje bilhões de pessoas reconhecem Seu ensinamento como atual, Sua doutrina moral, jurídica e política são, porque eternas. Já Heidegger e Gadamer provavelmente serão uma nota de rodapé na história da filosofia.

A consciência do estar é reduzida ao corpo, ao ente finito, reduzindo a própria capacidade da consciência, que é una sendo múltipla. A Consciência de Ser é uniplurissubjetiva, isto é, única, com múltiplas perspectivas. Deus é a unidade da Consciência, é o Sujeito, a Consciência de Ser.

Ora, a vida eterna é esta: que eles te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus Cristo” (Jo 17, 3).

Vida eterna é conhecer o Ser, o Eterno, e conhecer não de modo meramente intelectual, na medida em que o verbo referido, na linguagem hebraica, significa a intimidade máxima entre o conhecedor e o conhecido; por exemplo, quando a Bíblia diz que um homem conheceu uma mulher isso indica a relação sexual entre eles, daí a expressão conhecer biblicamente.

Portanto, conhecer a Deus é viver a unidade com Deus, sendo sua expressão entre os homens, seguindo o exemplo, o método, o Caminho, Jesus Cristo. No mundo caído da irracionalidade, do egoísmo, após a Queda, é necessária razão, Logos, para a Vida plena.

Desse modo, a preocupação do homem não é com a morte do corpo, com a morte do estar, pois o estar, como provisório, está destinado à morte. A preocupação do homem é com a morte do Ser, ou seja, se identificar com aquilo que desaparecerá, pelo que a busca do homem é pela sanidade, estar em harmonia com o Ser, que É.

No caso do Direito, o que se busca é o seu Ser, a causa do estar, o que é além das normas, além dos textos, que são variados, se busca a racionalidade/moralidade convencional que se funda na racionalidade/moralidade natural da consciência una, do Ser.

A fonte do Direito até o iluminismo era a divindade, pela origem divina dos reis. A fonte do Direito era Deus, o Sujeito, e continua sendo.

Com o iluminismo, a fonte do Direito passou para a razão humana posta na lei, mas essa concepção é limitada a uma razão material e parcial colocada em lei escrita, quando a fonte do Direito é razão humana enquanto Logos, enquanto imagem de Deus, enquanto razão total, que pode se eternizar, que tem validade universal. A essência da Declaração dos Direitos Humanos é deturpada pela razão material e parcial, pela vontade da maioria.

O contrato social, como Rousseau nos diz, se baseia na Vontade Geral, que é o Logos ou Sujeito universal, e não na vontade de todos ou da maioria. O art. 6.º da Declaração dos direitos do homem e do cidadão de 1789 afirma que a lei é a expressão da vontade geral. E segundo Roussseau, a vontade geral é sempre reta e sempre tende para a utilidade pública, não entrando na vontade geral as vontades particulares que se destroem reciprocamente. Sendo sempre reta e boa, a Vontade Geral é o Ser da Lei.

A vontade de todos ou da maioria significa uma razão humana parcial, contrária à natureza humana coletiva, pelo que a vontade de todos ou da maioria pode ser a da Besta, como ocorreu durante o nazismo, o comunismo, e como tem ocorrido com esse capitalismo selvagem, em que a vontade do Estado se limita aos interesses econômicos de determinados grupos de poder. Assim, o Estado laico que temos hoje, baseado na vontade de todos ou da maioria, ou da minoria, em vontades privadas e particulares, é a Besta do Apocalipse, que tem levado à sexta extinção em massa da vida na Terra, pois a vontade da Besta é provisória, contrária à Vida, ao Ser.

Como salientado, a fonte do Direito é o Logos, a Palavra, e Direito é palavra, é sua essência, não palavra sem conteúdo, mas A Palavra, que dá sentido ao Ser, O Verbo ou Logos. O sentido do Direito decorre do uso da palavra, colocada no texto da lei, nos atos jurídicos e na decisão judicial. Interpretar a Lei é obter seu Sentido, seu Espírito, a Vontade Geral, o Espírito Santo, o Logos.

A Lei é expressão do Sujeito, pelo que na sua interpretação o Sujeito identifica o Direito, a Lei, na norma, no texto normativo, significado e entendimento esses que estão no próprio Sujeito, que É a essência do Direito, com sua Consciência uniplurissubjetiva, como Eu Sou.

A decisão judicial é palavra especial, pois é aquela que confere o sentido do Direito para os casos julgados pela máxima autoridade pública, aquela com competência para dizer o significado da Lei, com grandes reflexos na vida das pessoas. Não é sem motivo que a religião monoteísta tem uma conotação jurídica, em que a interpretação da Lei tem fundo religioso. A comunidade gira em torno da Lei, sendo o sinédrio um tribunal ao mesmo tempo político, jurídico e religioso, para não falar na charia, ou sharia.

Também no Ocidente a comunidade gira em torno da Lei, mas o sentido da Lei foi capturado por ideologias materialistas, em favor de um comunismo material e de um capitalismo de mercado, em que a vida se perdeu, o espírito ficou alienado de sua origem, da Vontade Geral. Assim, a função do juiz, como guardião da Constituição, da Vontade Geral, é dar vida, dar sentido à Lei.

Deus se levanta no conselho divino, em meio aos deuses ele julga: ‘Até quando julgareis injustamente, sustentando a causa dos ímpios? Protegei o fraco e o órfão, fazei justiça ao pobre e ao necessitado, libertai o fraco e o indigente, livrai-os da mão dos ímpios! Eles não sabem, não entendem, vagueiam em trevas: todos os fundamentos da terra se abalam. Eu declarei: Vós sois deuses, todos vós sois filhos do Altíssimo; contudo, morrereis como um homem qualquer, caireis como qualquer dos príncipes‘. Levanta-te, ó Deus, julga a terra, pois as nações todas pertencem a ti!” (Salmo 82).

Como o Salmo ressalta, as autoridades são deuses, especialmente os magistrados, mas deuses que também são julgados, pois toda autoridade vem do Deus Altíssimo, que julga os demais deuses. Jesus Cristo citou expressamente esse Salmo, dando-lhe especial valor. E o cristianismo completou sua interpretação, indicando que os jurisdicionados, aqueles julgados, do mesmo modo, são deuses, como ocorreu com o próprio Jesus, que reconheceu a autoridade de seu julgador.

Jesus respondeu: ‘Você não teria nenhuma autoridade sobre mim, se ela não lhe fosse dada por Deus. Por isso, aquele que me entregou a você, tem pecado maior’” (Jo 19, 11).

Outrossim, a autoridade dos juízes é dada por Deus, pelo Logos, para o serviço divino de fazer Justiça, especialmente ao pobre e ao necessitado, e por isso os juízes são chamados deuses pelo salmista, na medida em que a autoridade pública é uma autoridade que vem de Deus, do Espírito, para o bem, a realização do Reino de Deus, em que todos os seres humanos são deuses e devem ser preservados, ainda que provisoriamente possa estar demoníaca, para servir à Besta, para a qual os homens são coisas, e podem ser usados.

Por isso, acatando a Vontade Geral, decido pela Vida, pelo Ser, pela Eternidade, para mim, Eu Sou a fonte do Direito, não como ego, como pessoa, mas como Humanidade com consciência de integrar o Sujeito, submisso à Lei, à Constituição, à Vontade Geral, submisso a Deus, ao Logos, como cristão, portador de razão, como filho do Homem, como manifestação do Ser, da Consciência Una, como imitador de Jesus Cristo, porque, apesar de minhas falhas e imperfeições, de por vezes fazer, como são Paulo, o mal que não quero (Rm 7, 19), vivo para Ser Um com Deus, com o Logos, para servir à Sua Vontade Geral, cujo sentido está na interpretação autêntica da Constituição, em que pese a deturpação provocada pela vontade da maioria, à esquerda materialista ou à direita amante do dinheiro, até mesmo no Supremo Tribunal Federal, olimpo moderno, cujos deuses também morrerão e cairão como qualquer dos príncipes…