Ciência extraordinária

A ciência é extraordinária, não é algo comum, mas diferenciado; apesar de existir uma modalidade ordinária dessa atividade humana. Outrossim, podemos falar de dois tipos de ciência, a verdadeira Ciência, admirável, excepcional; e a habitual, ou vulgar.

A primeira é associada à inovação, à criatividade, à ação do Criador, referindo-se ao estudo do Logos, pelo qual tudo foi feito. Tem natureza filosófica, especulativa, artística. Essa Ciência é única, irreproduzível em laboratório, depende de situações e/ou pessoas únicas para seu desenvolvimento, tais como Jesus, Sócrates, Abraão, Moisés, Newton, Galileu, Einstein. O universo foi criado uma única vez, a vida teve início em condições e em um tempo especiais, sendo igualmente singulares os eventos fulcrais da história coletiva e individual, como o fim de um império, ou o nascimento e a morte de um ente querido.

Mesmo em sua unicidade, a ciência extraordinária investiga as relações primárias de causalidade, porque estuda o mundo das causas, a ontoteologia. Trata, ainda, do âmbito da epistemologia e estabelece as categorias fundamentais do conhecimento, os primeiros princípios, sendo a matéria objeto de estudo da Metafísica aristotélica, ou Teologia, ligando aqueles eventos únicos e os fatos da vida cotidiana a uma razão que lhes seja comum, em que pese a dificuldade e excentricidade dessa empreitada.

Já a versão ordinária abarca o mundo dos efeitos, das regularidades e dos limites das ações causais, proporcionando o desenvolvimento da tecnologia. Isso não significa que a versão mais elevada da ciência não aborde as questões permanentes, pelo contrário, uma vez que sua área de atuação é exatamente a eternidade, ou seja, aquilo que é uno e imutável, o permanente do fluir temporal e material, e é a partir dessa ideia que se extrai a regularidade comum da ciência ordinária.

A ciência extraordinária gera, portanto, a ordinária, a qual, por sua vez, está na origem da tecnologia. Quanto mais profunda a primeira, mais específica a segunda e mais eficiente a terceira.

A atividade cognitiva vulgar, por sua vez, divide-se nos ramos do conhecimento, proporcionando as especializações científicas. Suas inovações, via de regra, são restritas às áreas respectivas. Tais ramos trabalham no âmbito fenomenológico, com as categorias próprias das respectivas áreas do conhecimento, em que as relações significativas são limitadas.

Pode-se dizer que uma espécie volta seu olhar para o conhecimento futuro, para a razão latente ou nascente, enquanto a outra se dirige ao passado, que já foi descoberto e está manifesto, ao menos parcialmente, havendo, contudo, uma ligação íntima entre esses saberes, decorrente da unidade lógica que inevitavelmente abarca ambos, no presente, na eternidade que conecta permanentemente o antes e o depois.

Uma é a ciência da ideia geral, universal, em todos os seus momentos, que inclui a particular, em suas singularidades, enquanto a outra é a razão da contingência, passageira, da temporalidade em si.

A mais elevada especialidade da ciência particular, para ser realmente elevada, deve alcançar o nível extraordinário, e por isso o título de doutor é melhor definido como PhD, que significa “doutor em filosofia”, pois PhD é uma abreviação de “Philosophy Doctor”, decorre da expressão latina philosophiae doctor ou doctor philosophiae, que remete ao significado da palavra grega “filosofia’, amor ao conhecimento ou amor à sabedoria.

O conhecimento extraordinário transcende o plano meramente sensorial, está além do mundo passageiro, sendo associado à sabedora. É, outrossim, de natureza espiritual, na medida em que o espírito é a totalidade das relações, é a unidade que permanece, a despeito do constante devir. A ciência em questão, portanto, busca o entendimento da totalidade das relações entre os fenômenos, enquanto a ordinária já pressupõe algum nível de relação entre todos os fenômenos, o que é inerente à proposta científica, mas tem seu foco em algumas relações restritas.

As verdadeiras mudanças no entendimento ocorrem quando há modificação na concepção sobre a qualidade das relações totais, quanto à sua causalidade, e nas categorias mentais ou filosóficas adotadas para explicar racionalmente essas relações.

Nesse ponto, a filosofia grega foi o marco na adoção de uma determinada racionalidade para explicar todos os fenômenos do mundo. O Monoteísmo significou a submissão cósmica total a um único Princípio ou Inteligência, que, pelo Cristianismo, foi incorporado à racionalidade humana, ainda não alcançada em seu verdadeiro sentido.

Em outro plano, o trabalho de Newton se baseou na unidade entre a matéria celeste e a terrestre. A relatividade de einsteniana uniu matematicamente os conceitos de tempo e de espaço. Finalmente, a física quântica demonstrou uma integração entre o pensamento, e seus instrumentais, e a realidade observável.

A evolução científica, assim, culmina em uma cosmovisão que não foi compreendida sequer pela comunidade acadêmica, porque continua atrelada a uma visão ordinária de ciência, parcial, e majoritariamente materialista. Por isso estamos num interlúdio no avanço do conhecimento humano, que está se desenvolvendo apenas lateralmente, sem perceber seu sentido mais profundo, dependente da verdadeira Ciência, até que esta seja revelada, como de praxe, numa situação excepcional, que será um salto qualitativo, um salto quântico, no entendimento, em direção ao plano espiritual, que é o locus originário da ciência extraordinária. Como disse o apóstolo dos gentios:

O homem psíquico não aceita o que vem do Espírito de Deus. É loucura para ele; não pode compreender, pois isso deve ser julgado espiritualmente. O homem espiritual, ao contrário, julga a respeito de tudo e por ninguém é julgado” (1Cor 2, 14-15).

Outrossim, o mundo só é inteligível espiritualmente, porque é pelo espírito que os eventos do mundo são conectados racionalmente.

Nesse ponto, é importante dizer que a coerência intradisciplinar é obrigatória nas ciências particulares, de modo que uma mesma racionalidade possa ser usada indistintamente nos fenômenos observados nesses campos de observação.

A Filosofia, a Ciência autêntica, de seu lado, que tem como objeto imediato a linguagem, com sua coerência disciplinar própria, sua lógica, mas cujo referencial significativo é o conteúdo das ciências particulares, com a sua harmonia simbólica intradisciplinar, porque a linguagem filosófica adota os conceitos mais avançados das áreas específicas do conhecimento, desenvolve, ainda, a coerência interdisciplinar desses conceitos, sua significação mais própria em relação à completude dos fenômenos existenciais.

A Ciência, portanto, tem um aspecto epistemológico associado, necessariamente, a uma abordagem ontológica e existencial das coisas do mundo, conectando todos os significados possíveis da linguagem, de forma lógica e coerente, e por isso é absurda a unidade e racionalidade do universo conhecido, e extraordinária, e de tamanha extravagância, que a ciência materialista se viu obrigada a criar uma infinitude de outros universos, o multiverso, numa irracionalidade que chega ser ridícula, por rejeitar um postulado filosófico básico, a Navalha de Occam, apenas para não reconhecer a lógica extraordinária da Ciência, apenas para negar o Logos, com a moralidade e a normatividade que lhe são inerentes. Ainda assim, o conhecimento autêntico é acessível para os que se lhe abrirem seus corações:

A Sabedoria apregoa pelas ruas, nas praças levanta a voz: grita nas encruzilhadas, e nas portas da cidade anuncia: ‘Até quando, ingênuos, amareis a ingenuidade, e vós zombadores, vos empenhareis na zombaria; e vós, insensatos, odiareis o conhecimento? Convertei-vos à minha exortação: eis que vos derramarei o meu espírito e vos comunicarei minhas palavras’” (Pr 1, 20-23).

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