Mais uma batalha da guerra cultural ocorreu na última semana, em que um vídeo do Secretário de Cultura, Roberto Alvim, com referência a uma determinada fala de um nazista destacado, levou à sua demissão do cargo.
As referências a uma manifestação específica de Goebbels são inequívocas, mas daí a concluir, por si só, que houve a intenção de restaurar o pior do nacional-socialismo, o que é de todo reprovável, já é uma precipitação. Nesse ponto, muitos dos que defendem ferrenhamente a presunção de inocência até o trânsito em julgado foram os primeiros a condenar, de plano, a conduta do cidadão, sem ouvi-lo e sem a menor investigação sobre suas possíveis intenções.
Os que condenaram sumariamente Roberto Alvim, sem processo e sem defesa, se usassem a mesma argumentação, deveriam exigir a cassação do registro de determinados partidos políticos expressamente vinculados à ideia comunista, que causou dezenas de vezes mais mortes do que o nazismo, valendo destacar que ambos os movimentos, comunismo e nacional-socialismo (nazismo), foram e são desastrosos, como são muito próximos em termos ideológicos, fato provado, pelos critérios usados para reconhecer a culpa de Roberto Alvim, pelo documentário “A verdadeira história soviética” (https://www.youtube.com/watch?v=pMx8SHzhk1U&has_verified=1), com a descrição: “A verdadeira origem da loucura nazista, mostrada neste documentário. Isso é uma amostra do que o futuro reserva para os simpatizantes de doutrinas vermelhas”. Toda pessoa que ridiculariza a ideia segundo a qual o nazismo foi “de esquerda” deveria assistir a esse vídeo; são oitenta e cinco minutos com capacidade de mudar a compreensão de uma pessoa sobre as ideias dos últimos dois séculos que devastaram, em escala industrial, a humanidade no século XX.
Deve ser ressaltado que as ideias humanas estão ortodoxamente equivocadas desde o dogma, desde o século IV, quando o conceito de encarnação do Logos foi indevidamente limitado, por uma má interpretação da mensagem de Cristo, o Evangelho do Messias Judeu. O resultado dessa teologia enviesada está na doutrina política dos séculos seguintes, rejeitando a realização da era messiânica, do Reino de Deus, na história, o que permitiu, em última análise, o desenvolvimento das propostas comunista e nazista.
Na filosofia recente, as consequências de tal equívoco podem ser encontradas nos grandes filósofos, do iluminismo e do período posterior. Hoje ouvi uma exposição muito interessante, com o título “Ernst Cassirer – Kant, Hegel, & Heidegger” (https://www.youtube.com/watch?v=_64aTGDVH0E), em que é destacada a volta ao pensamento kantiano e seu idealismo transcendental como uma alternativa ao mecanicismo materialista e à metafísica hegeliana.
Na guerra cultural, que é também filosófica, portanto, há uma vertente materialista, de um lado, e uma relacionada ao cristianismo, de outro lado, na medida em que tanto a filosofia de Kant como a de Hegel são estruturadas a partir de uma concepção teológica do mundo, associada às ideias cristãs.
Para superar a encruzilhada cultural que vivemos, outrossim, é indispensável a compreensão do centro da cruz, o judeu crucificado por se comportar como um rei e um sacerdote, por ser o ungido pelo Deus de Israel, e por isso O Messias, e seus significados teológicos, filosóficos e científicos.
Na interpretação teológica do cristianismo, considerando as filosofias de Kant e Hegel, entendo a proposta do último mais adequada, no sentido de ser possível algum conhecimento da coisa em si, da realidade numinosa que o kantismo entende incognoscível, e pela ideia de realização do Espírito na história humana. Vejo a filosofia de Kant como a do peixe sobre sua realidade, ignorando sua imersão no oceano, pois todo conhecimento parte de alguma relação cognitiva do sujeito com a coisa em si, mínima que seja, sem a qual o entendimento da coisa é impossível.
Nesse sentido, todo conhecimento humano a priori é a posteriori, é resultado do contato espiritual com a coisa em si, pelo que não há que se falar em juízo sintéticos a priori fora de uma relação entre o temporal e o eterno, na medida em que nosso conhecimento é formado dentro da temporalidade, enquanto as categorias se referem ao início mais remoto da temporalidade, valendo para uma espécie de eternidade temporal, como reflexo da atemporalidade permanente. Assim, o juízo sintético, referente à eternidade temporal, somente é possível quando relacionado a uma atemporalidade permanente, que confere unidade sintética àquele juízo, pois sem a concepção de alguma permanência, que dá base à unidade cognitiva, não há como ser concebida a própria ideia de síntese, que liga o princípio ao fim, o alfa ao ômega.
Voltando, para concluir, ao vídeo de Roberto Alvim, sua defesa não é destituída de fundamento (https://www.youtube.com/watch?v=AEeFlIr0d7I), sendo possível interromper uma conexão simbólica parcial para não adotar todo um ideário relacionado àquela ideia, por mais que seja complexa, mas não impossível, essa desvinculação. Caso contrário, dever-se-ia rejeitar, por completo, tudo o que Heidegger escreveu, diante de sua associação com Hitler, conforme trecho de uma carta enviada a seu irmão Fritz Heidegger:
“Caro Fritz, parece que a Alemanha despertou, compreendeu seu destino. Gostaria que lesses o livro de Hitler, fraco nos capítulos iniciais autobiográficos. Já ninguém mais pode negar que este homem possui, e sempre possuiu, um seguro instinto político, quando todos nós ainda estávamos obnubilados. O movimento nacional-socialista crescerá no futuro, com novas forças adicionais. Já não se trata da mesquinha política de partido – trata-se antes a salvação ou do ocaso da Europa e da cultura ocidental” (http://www.ihu.unisinos.br/185-noticias/noticias-2016/561279-o-nazismo-segundo-heidegger-hitler-desperta-nosso-povo).
Portanto, é deveras complexa a situação da encruzilhada cultural em que nos encontramos, e é somente por meio de uma profunda e constante vigilância racional dos símbolos que nos rodeiam, através da atenção da consciência aos espíritos que nos influenciam, que poderemos vencer a barreira de ignorância, incoerência e irracionalidade que insiste em se colocar entre nós e a Verdade que pretendemos alcançar, porque, de fato, “a cultura é a base da pátria, e quando a cultura adoece, o povo adoece junto”, sendo necessário desenvolver, sim, uma cultura relacionada a “nossos mitos fundantes: a pátria, a família, a coragem do povo e sua profunda ligação com Deus”, o Deus de Israel, pai do judeu Jesus.
Somos filhos da terra, somos filhos de Deus, por causa do Messias, do judeu rejeitado pelos judeus:
“Veio para o que era seu e os seus não o receberam. Mas a todos que o receberam deu o poder de se tornarem filhos de Deus: aos que creem em seu nome, ele, que não foi gerado nem do sangue, nem de uma vontade da carne, nem de uma vontade do homem, mas de Deus” (Jo 1, 11-13).
Um dos passos fundamentais para superamos a encruzilhada em que estamos, finalmente, é o reconhecimento, pelos judeus, que há uma causalidade filosófica, histórica e material entre a vida de Jesus, seu Messias, sua salvação pelo mundo ocidental, que impediu que a “solução final” fosse concluída, e seu retorno profético à Terra Santa.
Isso é Teologia, é Filosofia, é Ciência e, por que não, Cultura.
Na minha opinião, a análise correta desse fato é a do Prof. Tércio
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Ciência e Religião não se misturam, meu caro articulista.
Teus argumentos possuem uma contradição intrínseca que é simplesmente insuperável, pois você fala em ‘mitos fundantes’ e cita seus exemplos. Os seus mitos!
Para restringir a análise, digo, o comentário ao texto, em algum momento das suas reflexões chegastes a conjecturar sobre quais seriam para os povos indígenas que aqui habitavam antes das invasões portuguesa, espanhola e holandesa, QUAIS ERAM OS SEUS MITOS FUNDANTES?
E sobre os 388 anos de escravidão e sadismo perpetrados pela ‘elite intelectual’ que subjugou os negros por aqui, você chegou a ensimesmar-se a esse respeito e questionar quais eram seus MITOS FUNDANTES?
Cosmovisão, materialismo, capitalismo, liberalismo, canibalismo, solipsismo, cristianismo, protestantismo, uberismo, lavajatismo etc, SÃO APENAS FIOS DE UMA MESMA TEIA tecida pelas ações e escolhas dos humanos. Uns 5% do total dessa espécie “deliberam e sacramentam” a fortuna ou a desdita dos outros 95%.
Aliás, já deves ter lido sobre o DEUS de Baruk Spinoza, certo?
Pois é nele que eu acredito.
Fraterno abraço, e continue sua jornada.
PS: “A Teia da Vida, uma nova compreensão científica sobre os sistemas vivos”, de Fritjof Capra, é uma ótima leitura também, além do estudo/interpretação a posteriori da Bíblia.
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